terça-feira, 29 de dezembro de 2009

QUANDO O CUPIDO NÃO ACERTA...




POEMA DE MARIA TERESA HORTA

Morrer de Amor

Morrer de amor
ao pé da tua boca

Desfalecer
a pele do sorriso

Sufocar de prazer
com o teu corpo

Trocar tudo por ti
se for preciso.

SILÊNCIO...


QUE LINDOS CUPIDOS...




CUPIDO






OS LAMENTOS DA PAIXÃO NA MÚSICA ERUDITA OU LIGEIRA

OS LAMENTOS DA PAIXÃO NA MÚSICA ERUDITA OU LIGEIRA

Depois da minha postagem sobre as relações amorosas, QUE TERMINAM EM TRAGÉDIA, aqui ficam algumas músicas que aprecio e nos falam da ilusão da paixão e dos amores difíceis.
(...)
Como podemos nós definir a paixão? Qual a característica substancial que a torna reconhecível? Resultará de um simples ingrediente sexual desenfreado? Claro que não, porque existem paixões platónicas como os amores galantes dos trovadores, a Beatriz de Dante. Melhor será dizer que a essência do passional resulta do alheamento que ele próprio produz: o apaixonado sai de si próprio para se perder no outro ou, melhor dizendo, naquilo que imagina ser o outro. Porque a paixão, e este é o segundo traço fundamental que a caracteriza, é uma espécie de sonho que se deteriora no contacto com a realidade. Talvez seja por isso que, como terceira e necessária condição, a paixão parece exigir, quase sempre, a frustração, a impossibilidade de uma plena realização. (...)
O amor é representado em todas as culturas com os mesmos símbolos: arcos, flechas, olhos vendados, tochas a arder que inflamam os corações dos mortais. Normalmente é apresentado nu e com corpo de criança: porque é uma emoção que não se pode ocultar e porque permanece igual a si própria. A paixão nunca aprende: é sempre idêntica, eternamente jovem, intacta, irreflectida. «Mas como é possível que volte a fazer, nas mesmas ocasiões, as mesmas loucuras?», geme a razão, espantada, quando passamos horas à espera de um telefonema que nunca chega. «Será que não aprendo?» queixa-se o amante que sofre. E tem razão, porque o amor mantém-se impermeável à experiência.
Rosa Montero, Paixões, Editorial Presença, 2000

FARINELLI -LASCIA CHIO PIANGA MIA CRUDA SORTE - HANDEL

ANNE SOFIE VON OTTER - LASCIATEMI MORIRE - MONTEVERDI

CAETANO VELOSO - NÃO ENCHE

MAYSA - MEU MUDO CAIU

PLACEBO - BATTLE FOR THE SUN - DREAM BROTHER MY KILLER MY LOVER

ADRIANA CALCANHOTO - DEVOLVA-ME

BILLIE HOLIDAY - THE MAN I LOVE

BILLIE HOLIDAY - I'M A FOOL TO WANT YOU

DIANA KRALL - LOOK OF LOVE

segunda-feira, 28 de dezembro de 2009


O coração tem razões que a própria razão desconhece. Com a leitura de Paixões – Amores e Desamores que Mudaram a História, pode-se dizer que o amor e o ódio, querendo ou não, são os combustíveis de todos nós, dos mais nobres aos mais vagabundos dos corações. Amar ou não Amar, eis a questão my friend Sheakspeare.

PAIXÕES - ROSA MONTERO

Alguns dos pares famosos analisados por Rosa Montero - Tolstói e Sônia, Oscar Wilde e Sir Douglas, Verlaine e Rimbaud, Joana e Filipe.

TOLSTOI e SÓNIA


LEON E SÓNIA TOLSTOI
Escritor famoso, autor de Guerra e Paz e Ana Karenina, Leon viveu mais em guerra do que em paz com a sua mulher. Tinha 34 anos quando se casou com Sónia, de 18, numa cerimónia feita à pressa. Tolstoi sempre foi terrivelmente contraditório: anjo e fera, génio e miserável. Era bissexual e bebia muito. Até se casar, contraiu doenças venéreas de várias mulheres de vida fácil, amava platonicamente alguns homens e manteve uma tórrida relação com uma das suas camponesas, mulher casada com a qual teve um filho. Entre o noivado e o casório passaram-se apenas sete dias. No decorrer dessa mesma semana Tolstoi teve a cruel e original idéia de que a noiva lesse todos os seus diários íntimos, para saber com quem estava a casar-se. E a pobre Sónia, ainda uma menina, teve que engolir as escabrosas revelações de um senhor de 34 anos que mal conhecia. Ficou horrorizada. Após o casamento, foram morar em dois pavilhões apertados, imundos e escuros, sem tapetes, invadidos por ratos e com o jardim devorado pelas ervas daninhas. As dívidas de jogo de Leon haviam consumido a bela mansão de 36 quartos.
Sónia ficou grávida 16 vezes, sofreu três abortos e quatro dos 13 filhos que teve, morreram. Viveu o inferno do tolstoísmo. Aos 49 anos, Tolstoi mergulhou numa profunda crise de depressão. Tinha idéias suicidas e não via sentido na existência; até que decidiu criar uma nova religião, o tolstoísmo, e tornou-se uma espécie de guru pregando coisas como a abstinência sexual. Tudo adubado por furiosos sermões e iradas censuras, porque Tolstói transformou-se num fanático intolerante que imputava aos outros (sobretudo à mulher) as suas próprias falhas. Sónia enfrentou ainda o discípulo Chértkov que teve Tolstoi nos braços no leito de morte.
Por mais de duas décadas a mulher de Tolstoi tentou pôr ordem e sensatez no delírio: "O meu marido deixou absolutamente tudo sobre as minhas costas", escreveu lucidamente no seu diário, os filhos, a fazenda, a casa, os seus livros, os problemas económicos, o contacto com as pessoas e com os editores, e depois, com uma indiferença egoísta e críticas, despreza-me por eu fazer tudo isso. Mas, se o louco não era tido como tal, então ela, Sónia, o que era? Pouco a pouco foi perdendo a noção do real. Se o louco não estava louco, então a louca era ela.
Sónia perde a razão e entrega-se a comportamentos histéricos e paranoicos. Durante as várias crises, atirou-se para uma represa gelada, tentar atirar-se a um poço e golpear o próprio peito com um martelo. A sanidade só voltou com a morte do marido. Sónia administrou as propriedades da família, começou a escrever as suas memórias e visitava todos os dias o túmulo do marido, onde depositava flores até à sua morte.

OSCAR WILDE E SIR DOUGLAS


OSCAR WILDE E LORDE ALFRED DOUGLAS
A decadência na vida do escritor inglês Oscar Wilde foi resultado da sua obsessão pelo lorde Alfred Douglas, um jovem de 21 anos ''maldoso, egoísta, vaidoso, frívolo e violento'' que levou Wilde, então com 37 anos, a um mundo de chantagistas. Bosie, como Douglas era chamado por todos, usou o amante na sua luta pessoal contra o pai. Numa briga judicial, Wilde terminou preso e com os bens expropriados - e socialmente desmoralizado até morrer, aos 46 anos
Antes de ceder à homossexualidade e terminar a vida com uma paixão decadente, Oscar Wilde teve algumas namoradas e casou-se, aos 29 anos, com Constance Lloyd, ''uma mulher bonita, inteligente e leal, três anos mais nova que ele''. Segundo testemunhos, no começo de seu casamento Wilde estava muito apaixonado. ''Devia sentir-se feliz ao imaginar-se curado da sua homossexualidade: a vida era muito mais confortável na ortodoxia.'' Teve dois filhos com Constance, mas ''a mulher-mãe" transformou-se para ele num objecto sexual impossível de suportar: "Quando casei, a minha esposa era uma rapariga bonita, branca e esbelta como um lírio. (...) Depois de um ano, transformou-se numa coisa pesada e disforme (...) com seu espantoso corpo inchado e doente por culpa do nosso acto de amor.''' No entanto, sempre se trataram bem e mantiveram-se unidos. Três anos depois do casamento, Robert Ross, um rapaz de 17 anos e já experiente nesses assuntos, seduziu Wilde, então com 32 anos e levou-o para a cama. ''Enquanto o sexo com as mulheres lhe parecia sujo, o amor viril encerrava para Wilde toda a beleza, a espiritualidade e a transcendência.''.
Passada a paixão inicial, o encantador Ross tornou-se o seu melhor amigo (...) A partir de 1891, estreou em Londres quatro peças de teatro com crescente sucesso, até chegar ao triunfo total da sua última comédia, "A importância de ser Ernesto". Essa obra estreou em 1895 e recebeu críticas fabulosas; três meses depois, Wilde era preso. Tudo havia começado em 1891; foi então que Wilde conheceu lorde Alfred Douglas. Era o começo da sua decadência.

VERLAINE e RIMBAUD


PAUL VERLAINE E ARTHUR RIMBAUD
Verlaine já era um poeta famoso quando os dois se conheceram. Era feio, beberrão e violento, mas os seus versos tinham a chave certa para abrir as portas da alma. A mãe pensou em acalmá-lo da sua bissexualidade quando o casou com Mathilde, uma jovem linda de 17 anos. Nada mudou. Continuou a fazer versos excepcionais, mas batia na mulher, bebia muito e uma vez tentou matar a mãe. Tinha 27 anos quando conheceu Rimbaud, um belíssimo rapaz que fugiu de casa várias vezes e em algumas delas dormiu na rua e vasculhou lixo para encontrar comida. Morava no povoado de Charleville e lia Verlaine. Um dia escreveu-lhe uma carta com alguns dos seus poemas e o desejo de mudar-se para Paris. Verlaine aceitou a visita do jovem poeta e, juntos, passaram a viver o inferno.
Paul Verlaine vivia entre o amor violento e cruel de Rimbaud e o da sua mulher Mathilde. A vida aos pedaços, mas a poesia dos dois era tão forte quanto a obsessão que os unia. Foram ficando isolados à medida em que o relacionamento dos dois se tornava cada vez mais público devido à instabilidade. Resolveram separar-se. Voltaram. Foram morar para Londres. Romperam novamente. Verlaine vai para Bruxelas e implora uma visita do amigo. O descontrole fala mais alto e, depois de muito sexo, bebidas e brigas, Verlaine com um revólver em seu poder, atira em Rimbaud. A mãe de Verlaine acode o rapaz e acalma o filho. Decidem levar Rimbaud de volta para a estação para que ele regresse a Londres imediatamente. Na despedida Verlaine tenta mais uma vez matar o amante. É preso e condenado a dois anos de trabalhos forçados. Os dois continuaram vivos, mas a poesia para eles já estava morta.

JOANA e FILIPE


JOANA, A LOUCA, E FILIPE, O BELO
Neurótica, a princesa espanhola protagonizou cenas inesquecíveis em nome da paixão pelo seu marido, Filipe, o Belo: talhou o rosto de uma suposta amante do marido, para em seguida ser trocada por ele. Quando Filipe morreu prematuramente, aos 28 anos, Joana endoidou de vez e proibiu que qualquer mulher se aproximasse dos restos mortais. Contam que Joana mandou desenterrar o príncipe, que havia sido sepultado na abadia de Miraflores, e que ia vê-lo todas as semanas, abrindo o caixão, desamarrando o sudário e beijando os pés do defunto. E depois que, quando a peste a obrigou a sair de Burgos, levou consigo o cadáver de Filipe.
Durante o casamento, Filipe enganou e desrespeitou cada vez mais abertamente a sua mulher, e Joana, como era hábito, foi ficando mais e mais obcecada por ele. O arquiduque deixava-a trancada nos seus aposentos durante semanas, e ela passava a noite golpeando as paredes para irritar as companhias do marido.
A última rainha titular da história da Espanha morreu no fim de 1555, paralítica da cintura para baixo e atormentada pelas dores horríveis da gangrena. Tinha 77 anos e havia passado os últimos 47 encerrada em Tordesilhas.

domingo, 27 de dezembro de 2009

As Paixões - o poder da criação - a ternura, a beleza, o desejo - e a força da devastação - a perdição, a loucura, a violência.


Nocturno de Chopin Opus 9 nº2 por Maria João Pires

Nocturno - O Romance de Chopin


NOCTURNO - O Romance de CHOPIN por CRISTINA CARVALHO -

A vida intensa de Chopin romanceada em “Nocturno”, de Cristina Carvalho
A relação fabulosa de CHOPIN com GEORGE SAND atravessada pela criação de ambos. Chopin na música e Gorge Sand na escrita.
(...)Quando eu morrer, retirem-me o coração. Tenho medo de ser enterrado vivo...
Quando Chopin se encontrava no seu leito de morte, pediu à irmã, para após a sua morte, o coração ser retirado, e colocado numa urna de vidro, conservado em conhaque. A irmã respeitou o pedido do irmão e a urna de vidro, com o coração de Chopin, foi levada para a Polónia.
O compositor polaco Fryderyk Chopin morreu com apenas 39 anos mas “viveu intensamente”, diz a escritora Cristina Carvalho, que pesquisou durante dois anos sobre a vida do pianista para a colocar num livro.
Neste “NOCTURNO” fica-se a conhecer melhor a história deste homem “extremamente sedutor, muito sensual e muito andrógino” e da sua época, das suas qualidades e limitações, amores e desamores, alegrias e sofrimento, desde o seu nascimento, na aldeia polaca de Zelazowa Wola, até à morte, em Paris, a 17 de Outubro de 1849.
Cristina Carvalho afirma que “todas as datas e referências correspondem à verdade histórica”, embora salvaguarde a existência de “muitas omissões”, indicando ainda que “apenas quis escrever alguns apontamentos duma vida que, embora muito curta, foi incrivelmente apaixonada e apaixonante”.

(...) Passaram-se nove anos. Nove tortuosos e singulares anos. O nosso convívio, ao princípio extraordinário, tornou-se esquisito, anormal, mas prosseguiu. Maman Sand teve as artes necessárias para me prender, fez com que eu me sentisse dependente, às vezes doente de propósito, e ora me aparecia como uma mulher, ora me aparecia como um homem, ora me aparecia como uma mãe, ora me aparecia como uma filha.

As sonatas, as fugas, os romances, as fantasias, os nocturno, e, naturalmente, o Impromptu dão conta e revelam esta minha vida. Basta ouvi-los com atenção.

O período da minha vida com George Sand foi prolífico mas também foi infeliz. Esta é a verdade. Ela nunca me foi fiel. Ela foi sempre, disfarçadamente, imperceptivelmente e literariamente, infiel.

Eu fui-lhe sempre fiel, mas musicalmente infiel. Não podia ser de outra maneira. (...)

Sextante Editora, Novembro de 2009


GEORGE SAND


TÚMULO DE CHOPIN - POLÓNIA


PAIXÕES E DESILUSÕES

ADORO SERES HÍBRIDOS - ADAM LAMBERT - SO HAPPY I COULD DIE -

sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

BLOOD ROSES



A POÉTICA DO SUICÍDIO EM SYLVIA PLATH

OLMO


Conheço o fundo, diz ela. Cheguei lá com a minha raiz maior:
É disso que tu tens medo.
Mas eu não tenho medo: já lá estive.

É o mar o que houves em mim,
As suas insatisfações?
Ou a voz do nada que era a tua loucura?

O amor é uma sombra.
Como ficas prostrada e chorosa depois
Escuta: são os cascos dele: desapareceu como um cavalo.

Toda a noite vou galopar, assim, impetuosamente,
Até que a tua cabeça fique uma pedra e a tua almofada um pequeno monte de turfa,
Fazendo eco, fazendo eco.

Ou deverei eu trazer-te um som de venenos?
Agora é a chuva, este quase silêncio.
E este é o seu fruto: da cor metálica do arsénico.

Tenho sofrido a atrocidade dos crepúsculos.
Queimados até à raiz
Os filamentos vermelhos ardem, ficam espetados, mão de fios eléctricos.

Desfaço-me em bocados de caruma que voam em várias direcções.
Um vento tão violento
Não aguenta espectadores: tenho de gritar.

Também da lua ausente a piedade: havia de arrastar-me
Cruel, na sua esterilidade.
O seu esplendor ofusca-me. Ou talvez a tenha agarrado.

Vou deixá-la ir. Vou deixá-la ir
Diminuida e esvaziada, como após uma operação radical.
Como os teus sonhos maus me possuem e alimentam.

Sou habitada por um grito.
Noite após noite bate as asas
Procurando com as garras algo para amar.

Aterroriza-me esta coisa tenebrosa
Que dorme dentro de mim;
Todo o dia sinto o macio voltejar das suas penas, a sua malignidade.

As nuvens passam e dispersam-se.
Serão essas as faces do amor, esfumadas coisas que não se recuperam?
É por isto que perturbo o meu coração?

Sou incapaz de aprender mais.
O que é isto, este rosto
Tão assassino em seus tentáculos estranguladores?-

O seu ácido silvo de serpente.
Petrifica o desejo. Erros que isolam, essas falhas lentas
Que matam, e matam, e matam.


Ariel,tradução de Maria Fernanda Borges, Relógio D'Água, 1996

BOAS FESTAS E PROSPERIDADE

(...)
De qualquer modo, este ano não quero cá presentes.
Afinal, só por acaso estou viva.
(...) Sylvia Plath


quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

NÃO É PRECISO GRITAR

No intervalo de uma das sessões de cinema e a propósito do livro Não é Preciso Gritar de Eduarda Chiote, editado pela Campo das Letras. A escritora na foto com João Borges.











Exibição do filme UMA PEDRA NO BOLSO de JOAQUIM PINTO

20 ANOS DA MEDEIA FILMES E O CINEMA DE JOAQUIM PINTO

Cinema King - Lisboa - 20 de Dezembro

Exibição do filme Uma Pedra no Bolso de Joaquim Pinto - seguido de debate.
Presentes : Paulo Branco, Inês de Medeiros, Luís Miguel Cintra, Joaquim Pinto, Vasco, jovens cineastas como João Salaviza (Palma de Ouro no Festival de Cannes, com o filme Arena), Eduarda Chiote (autora do guião do filme - Uma Pedra no Bolso) e muito público interessado.

Poema de Manuel de Freitas

LONELY CHRISTMAS JOINT

Espero que me desculpes a banalidade
do enredo. As primas deitaram-se,
cansadas de povoar o mundo,
e os pais e tios procuram um calor
que não seja ainda a morte.
A Noémia, a avó e a irmã
deixaram entretanto de ser vistas.

Mas trocaram-se prendas, no intervalo
dos sorrisos, e abraços anuais
no intervalo das prendas. O frio, ao menos,
revelou-se coerente e natalício.
Fez durar um pouco mais o coração
refogado, numa adega sem saída.

É sempre assim: há quem se habitue
e há quem fume um charro,
à espera de nenhum poema. As diferenças
tácitas entre os mortos darão esta noite
muito que pensar a Herodes.

TERRA SEM COROA, teatro de vila real, Outubro de 2007

AINDA A FEIRA LAICA - FÁBRICA BRAÇO DE PRATA - 19 DE DEZEMBRO






A tarde era fria, mas o calor humano, rodeado de livros aquecia todos os que trocaram centros comerciais e natalícios, pela visita à Fábrica Braço de Prata, num Sábado à hora do lanche. E cheirava bem. Preparativos para um jantar, noutra sala, e mesinhas repletas de livros a seduzir o olhar dos visitantes.
Manuel de Freitas e Inês Dias, no seu espaço dedicado à Editora Averno. Os livros no seu conjunto destacavam-se pela linha gráfica a que já nos habituamos. LINDOS de morrer.








































segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Metamorfose - Desenho de Graça Martins - anos 80


Esboço Poético Sobre a Pintura de Graça Martins
por Isabel de Sá
A rapariga idealiza infinitamente, os dedos em fios cinzentos, ondulantes na textura. Gaze, figuras nítidas, olhares claros sob o tempo, frágeis metamorfoses.
Meninos em gaze líquido, adolescentes belíssimos num isolamento algo expectante ou buscando seduzir na sua imobilidade. E toda a gaze é água ou nervura, ou fio de pele. Invisível fio que une corpos e corpos num desespero sem fim, onde tudo parece de uma imensa serenidade.
Figuras sonham de encontro ao abismo, o rosto frio, as pálpebras magoadas, o corpo de mármore. Isoladas, figuras feitas de esqueleto e dúbia concentração, dadas a solicitações interiores, deambulam, fixam-se em posições invulgares, num autismo perfeito. Algumas vivem dias seguidos envolvidas em lençois, como coladas às paredes.
Corpos fragmentados por vozes, ruídos dispersos, uterinos.
Que conivência tão forte os une há tanto cansados. Sob a música clara do esquecimento mãos torcem os próprios ossos. Uma hera germina em limitado espaço e a rapariga aparece em plena claridade; um tempo de infância não esclarecido, o corpo em luminosos vermes ou pequeníssimos farrapos, os cabelos - raízes em direcção à terra.
A rapariga desfaz o retrato, lírios como bichos...
Entre nervura e pólen, corpos intactos respiram luz. Ainda.
Ela vem do exterior, arrasta tumultos, ideias, um frágil ramo de árvore. A vida confusa, dividida.
Aquilo que é interior e nasce involuntariamente. Violetas deixadas em água, o desenho incompleto para sempre inútil.
Dizia: Tenho que organizar. Como um esquema. São fotografias. Catalogar. O tempo. Perco-me. Um pormenor, muitas vezes só um pormenor. Não sei como sair de tantos fios.
O instante poético abre caminhos, a fita de veludo prende uma chave. Máscaras de cal quase gesso de tão pouco móveis. Lábio de carmim. Objectos de infância e de morte.
Debruçava-se sobre a imensa folha - redemoinho impossível. A música. O insecto azul-violeta fixo de encontro à parede. A moldura doirada e negra. Um sinal fúnebre. A asa de veludo em relevos aquáticos; o tom insidiosamente devorado pela luz. A bola de cristal ainda na memória.
Texto publicado no JN, página de Cultura, Fevereiro de 1982