domingo, 30 de agosto de 2009

Desenho de RUI PAES
Colecção Particular de Graça Martins

Dois poemas de EUGÉNIO DE ANDRADE

O SORRISO

Creio que foi o sorriso,
o sorriso foi quem abriu a porta.
Era um sorriso com muita luz
lá dentro, apetecia
entrar nele, tirar a roupa, ficar
nu dentro daquele sorriso.
Correr, navegar, morrer naquele sorriso.
DE PASSAGEM

Os Dioscuros. Eu vi-os numa praça de Roma, era de noite
levavam os cavalos pela mão. O seu olhar era oblíquo à passagem
das raparigas, mas era um para o outro que sorriam.
OS DIOSCUROS
Desenho de RUI PAES
Colecção Particular de Graça Martins

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Foto de Graça Martins



5 POEMAS de

ISABEL DE SÁ

Lembrar-te, é amar os corpos que partilhamos. O que me atrai em ti pertence à sabedoria do texto, à primeira palavra murmurada. O que me atrai no amor é a indeterminação, o impulso inicial. Os rostos que amei na tua ausência foram tocados por ti através da minha pele. Ninguém pode esclarecer a sua alma à margem deste pacto. O nosso amor desfaz o trio.
É na treva que sou obrigada a reconhecer o que escrevo. Sucumbo a uma grave abstracção de pensamento donde chego a sair tocada pela invocação da palavra.


DANCEI CONTIGO

Dancei contigo ao som
de uma canção sentimental
da minha adolescência. No teu pescoço
o perfume, sobre a mesa o desenho
por pintar, a luz do candeeiro,
a caixa de aguarelas Rembrandt.

Releio os poemas
do que nasceu em quarenta e cinco
e, na cassete, a canção chega ao fim.

Dancei contigo beijando-te
o pescoço, a pele bronzeada
do sol deste Verão.


Só o lume dos teus beijos rompe
a treva onde a solidão nos mata.
Enrolamos a vida no escuro,
na semente de um amor atribulado.

Conhecemos o ritmo e a sede,
a convulsão do desamparo.
No sentido do corpo, no acerto
desce a força pelos braços
na violenta festa do prazer.

Tudo o que disseste
no desaforo da paixão
só podia incendiar a vida inteira
e encher de esperança o universo.


REALIDADE

Por causa de um livro
vieste ao meu encontro.
Era Verão, não sabias de nada
nem isso interessava. Palavras
amavam-se fora de ti,
no atropelo das emoções.
Lá chegaria a primeira vez,
o encontro apressado num lugar
público. Desfeito o erro
ao toque da pele, não sei
se havia medo, a paixão queria-me
no lugar exacto do teu coração.
Palavras enrolaram-se na sombra
da vida a dor do sentimento.

Atingido o espírito, o tempo
da infãncia, a realidade. Em ti
a solidão que o prazer
não mata. Quero a beleza
dos versos revelada.
Alguns anos passaram sobre
a nossa história que não acabou.
A tarde envelhece e escrevo isto
sem saber porquê.




CELEBRAÇÃO
Que dizer do surto de afecto unindo o que parecia desligado, não sabemos, Partilhamos a indeterminação, o lume de um instante.
Ela geme porque sente a carícia e a dureza desse caule e abre-se até onde não é mais possível. Penetro em ti o centro donde irradia o prazer, repetes o gesto, violentas o que se esconde nesta noite de Setembro, na celebração da própria vida. Os corpos exigem intimidade recíproca. Há um sentido subterrâneo neste encontro.
Repetir o Poema, colecção Finita Melancolia, Quasi Edições, Famalicão, 2005

5 poemas de

JOAQUIM MANUEL MAGALHÃES


Era como estar só. Mas
estar só e feliz.
A varanda envidraçada,
o cheiro do café, um ramo
chamado sono.
Sombras de sol batiam
no chão de madeira velha.
Restos de água da noite
brilhavam nos vidros
os primeiros insectos.
A maresia das aves costeiras
lanceoladas de luz.
Os olhos pousavam à espera
de te voltar a ver.


Estava ali por esse dia.
Diante da janela, além
nos bancos de trás. Sorriu,
o ar ergueu-se em labirintos,
a tarde pousou-lhe na tez.
A cultura tornou-se um conflito
de desalento. No fim da aula
fomos tomar café.

Diante dos outros tocava só
na sua chávena, no maço
dos cigarros, era o seu corpo
que eu queria atingir.

Não és real, eu não existo.
Raizes desertas do auriga.


De novo o perfume se sentava
sereno e moreno no lugar
ao meu lado do carro, ia
pela noite de verão até
à sua casa, crescia
para a porta por abrir.

E voltava-se e ria e pedia
um último beijo com as luzes
nos máximos para ninguém
nos ver. Os pés hesitam no
asfalto, as mãos remordem
a beira da janela.


olhava nos meus ombros
o peso do seu pior adeus.


O cabelo rasgado de carícias, o orvalho da camisa.
Peguei no vidro dos sais, no sabonete
com musgo de linho, no ígneo frasco
de champô à névoa tão tensa
da lâmpada turva. O sândalo,
o bálsamo servo com vapor de mal.

Quando danço contigo as romãs do jardim
ardem no seu sangue. Quando danço contigo
no terror do salão tu és a viagem
mais rápida do meu olhar. Pego num copo
donde te vi beber e esmago-o
como se te apertasse a mão.


Meu amigo, amigo que depois foste de nós dois,
abençoado de rosto e corpo, gardasses-me tu
na convulsão de tábuas de um abraço,
nessa prisão que na altura não entendi.
Seria agora um galardão, uma honra tão alta
na memória, não apenas uma noite,
dessas curvadas pela despedida. Desse-me Deus
de novo, meu amigo, o torreão, a desordem , os teus passos,
esses laços que podia ser eu a desatar. Nada
em toda a extensão e duração do mundo
desejava mais do que dizer-te: foste
quem naufragou em maior temor e amor
a minha, a nossa - é difícil dizer - vida.


Uma luz com um toldo vermelho, colecção forma, Editorial Presença, Lisboa, 1990


quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Criei um blogue dedicado ao meu trabalho plástico, gráfico e fotográfico.
GRAÇA MARTINS A FIGURA E O SEU DUPLO
http://afiguraeoseuduplo.blogspot.com
Espero pela vossa visita

sábado, 22 de agosto de 2009

A poeta e pintora Isabel de sá tem um blogue dedicado exclusivamente à sua obra literária e plástica. Quem o visitar encontra livros, criticas, poemas e pintura.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009













Postagem dedicada ao PCD
A BELEZA DAS IMAGENS INTIMISTAS NO CINEMA DE TARKOVSKI
Andrei Tarskovsky (ou Tarkovski) nasceu a 4 de abril de 1932, em Sawraschje, perto de Moscovo . Morreu em Paris em 1986. Foi um dos mais criativos, inovadores e importantes cineastas surgidos no cinema soviético. A sua obra é atravessada por um caráter introspectivo, complexo e onde as questões humanas são colocadas em primeiro plano.
Filho do poeta russo Arseni Tarkovski, autor de muitos dos poemas recitados nos seus filmes. Formado em Geologia, abandona a profissão para se dedicar ao cinema. Em 1960 dirige o seu primeiro filme - O Rolo Compressor e O Violinista e em 1962 ganha o Leão de Ouro no Festival de Veneza com o seu segundo trabalho - A Infância de Ivan.
Com o ambicioso filme Andrey Rublev (1966), sobre a vida do famoso pintor russo, o realizador apresenta características que formariam a base principal de seu cinema: intimista, conciso e com atenção para os pormenores. Em 1972 lança Solaris, um filme misto de ficção científica e drama existencial, com discretas citações do filme 2001: Uma Odisséia no Espaço, de Stanley Kubrick. Esse filme é considerado por muitos o seu melhor trabalho.
Nos seus filmes posteriores, O espelho (1974), filme com traços autobiográficos e principalmente Stalker (1979), são prejudicados pela forte censura existente na URSS. Desiludido com o controle exercido sobre o seu trabalho, Tarkovski decide sair da URSS em 1983. Nesse mesmo ano lança Nostalgia. Ainda, depois de Nostalgia, filmaria O Sacrifício. De personalidade irritadiça e muitas vezes angustiada, o realizador sempre recusou qualquer tipo de influência e controle sobre o seu trabalho. A sua obra é marcada por um profundo sentido espiritual.
O cineasta russo TARKOVSKI











O CINEMA DE TARKOVSKY



























































A propósito da crítica literária

(...)
A pura razão crítica
E aqui reside um outro motivo polémico deste livro: que critério poderá levar JMM a expulsar da sua cidade ( explicita ou implicitamente) poetas como Ramos Rosa ou Gastão Cruz ( e toda a Poesia 61 em geral, com a excepção de Luiza Neto Jorge) e a acolher com tão boa vontade outros que nem são reconhecidos como poetas (refiro-me a Pedro Ayres de Magalhães) ou caíram no irremedível esquecimento público por serem considerados irrelevantes (por exemplo: António Manuel Couto Viana)? Joaquim Manuel Magalhães sabe perfeitamente que, sozinho, por mais autoridade que tenha, dificilmente sanciona um poeta e reabilita outro. Geralmente, isso não acontece senão através de mecanismos de reconhecimento colectivo. E também sabe o quanto existe de paranóico e de desrazão no acto de sustentar uma tese contra uma comunidade inteira - de intelectuais, de críticos - por mais cretina que ela seja. (...)
António Guerreiro, Expresso, 26 de Agosto de 1989
(...) creio que a relevância da crítica para a aceitação deste ou daquele autor se tornou talvez menor do que há 40 ou 50 anos - digamos no tempo de um João Gaspar Simões -, quando a palavra do crítico A ou do crítico B adquiria um peso decisivo (e talvez excessivo). O reconhecimento público de um determinado livro passa hoje por dois tipos de mecanismos diferentes, que podem aliás complementar-se: os primeiros obedecem a um ritmo muito rápido (cerca de três meses ou pouco mais) e dependem de estratégias de promoção editorial - lançamentos, entrevistas, pré-publicações, campanhas que levam os escritores a apresentar as suas obras pelo país ou pelo mundo fora, etc. Os segundos, de ritmo muito mais lento, implicam uma progressiva consagração crítica, sujeita a altos e baixos, que pode demorar longos anos e se dá sobretudo no espaço das universidades ou das chamadas revistas literárias - não forçosamente universitárias - cujos artigos podem sair muito tempo depois da publicação dos livros. Nada disto constitui novidade para ninguém - é apenas um retrato da situação actual e não entendo como pode sequer suscitar polémica.
Fernando Pinto do Amaral, revista Apeadeiro, nº3, Quasi Edições, 2003

quinta-feira, 20 de agosto de 2009


Poema de JOÃO BORGES

Cada pessoa enrola
um pouco mais
o pano preto da noite
à volta do meu corpo.

Agora, é lentamente
que me matam
e eu deixo. Fico parado
a sorrir, sem saber porquê.

Posso amar ou enlouquecer
quando te entregas,
sem rodeios,
na solidão das cidades.

Adormecidos no chão,
o brilho da pele,
nas gavetas o silêncio.
Escrevemos na parede,
sobre a cama,
que seria para sempre.

Brilho no Escuro, revista de poesia, nº1, edições anjo da guarda, Porto, 2009

Poema de JOSÉ MIGUEL SILVA
Ameaças

Aviso-te, velhaca, mais uma vez:
mete-te com os da tua laia, ladra,
que me levaste da mesa os copos
por onde bebia e deixaste na alma
as cadeiras frias. Arrepende-te, Morte,
e devolve-me as veias, os amigos,
as sementes de papoila. Restitui-me o intacto
futuro da minha juventude, a fotografia
onde cabíamos todos e a minha solidão
era uma onda quebrada nas pedras de gelo.
Traz-me de volta o silêncio do Jaime,
o cheiro a serrim, traz-me o Leal e ainda
o Artur, com todas as músicas desse verão,
o nó da fortuna, de '89. Não te esqueças
também do Luís, deixou por contar
o resto da história. Nem do Joel,
o mais desgraçado rapaz,
que me confessou um dia haver morrido
sem nunca ter sido beijado.
Fazes-me isso, e perdoo-te o resto. Mas
se torno a ver-te a menos de quinze passos
dos meus - eu juro que te mato.

Ulisses já não mora aqui, & etc, 2002
Foto de Graça Sarsfield
Rosa Alice Branco


Dois poemas de ROSA ALICE BRANCO

Palmeiras inclinadas. Ao longe o casario. É na água que o vejo, que sinto a cidade acordar.
Mais uma mulher que olha o rio. Tenho as mãos desatadas, os pés a caminho. As margens alargam quando estou perto, mas do outro lado as mulheres não reflectem o rosto ou mesmo a sua ausência.
São matéria do verbo fazer e caminham junto ao chão, na curva da noite para o marido. Gastos os sonhos por usar. Descorado pano que ficou ao sol. Nelas a cidade não acorda, não regressam os barcos à tardinha.
Vêm pela beira dos caminhos, a tristeza amável, a raiva cega e às vezes um sorriso que sacode os ombros porque até a tristeza tem um custo, uma esperança na sola do sapato. Vejo-as todos os dias e é como se a vida me atasse os pés, me anelasse os dedos. Como eu, outras mulheres olhando o rio, desbordando o pano, descozendo a sopa. Ama-se o homem que vira a esquina connosco e sabe que não podemos fingir que a ferida está fechada. As casas acendem.
E na água que vejo a sua luz descendo o rio. As mulheres passam em silêncio para as casas, atravessam a pele — deixam um retrato puído nas entranhas. Olho o rio e não sei fingir que finjo tanto mar.


Vozes e Olhares no Feminino, Edições Afrontamento, Porto 2001 p. 147
POR UM DIA DE INVERNO

O homem do talho morreu. Deixou mulher,
dois filhos e carne fresca estendida como roupa
no varal. Lembro-me do orgulho com que passava a mão
pelo cachaço. Lembro-me da peixeira
que nos acordava de manhã «peixe fresco
tão vivinho» e como era caro o estertor do linguado.
Mesmo as alfaces são frescas depois de mortas,
o molho de nabiças, até de uma cenoura esperamos
que seja fresca ali no prato com o linguado rigorosamente
apartado das espinhas. Tão fresco! O homem do talho
vai a enterrar depois do almoço. Agora jaz na capela mortuária
de rosto descoberto para a família e os curiosos. O homem
do talho morreu cansado, mas agora está fresco:
foi abatido ontem, será embalado às quatro da tarde.

Da Alma e dos Espíritos Animais, Porto, Campo das Letras, 2001

Poema de José Miguel Silva

Pelos beijos que poupei,
pelas pratas empenhadas,
pelas horas que não sei
onde foram derrubadas;

pelo breve candeeiro
que me tem encandeado,
pela falta de dinheiro
para o supermercado;

pela fuga dos amigos,
pela música calada,
pelos dias resumidos
ao encontro com o nada;


pelo pó da autoria
no fundo das estantes,
e pela miopia
dos soluços dominantes;


pela tinta nos meus dedos,
pelos passos sem destino,
pelos tojos e penedos
no meio do caminho;

pela vida dicionária,
exangue de ilusão,
e a arte solitária
de morrer do coração.


José Miguel Silva, in O Sino de Areia, Gilgamesh, Agosto de 1999.

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Fotos da capa, contracapa, poetas e ficcionistas por
GRAÇA SARSFIELD
















Antologia que reúne textos inéditos de todas as participantes em sessões do Ciclo “Vozes e Olhares no Feminino”, da programação de Literatura da Porto 2001, ocorridas no Auditório da Biblioteca Municipal Almeida Garrett.

O livro conta com trabalhos das seguintes autoras:
Em poesia,
Adília Lopes, Ana Hatherly, Ana Luísa Amaral, Fátima Maldonado, Helga Moreira, Inês Lourenço, Isabel de Sá, Maria Teresa Horta, Regina Guimarães, Rosa Alice Branco, Sophia de Mello Breyner Andresen e Yvette Centeno.

Em ficção,
Agustina Bessa-Luís, Clara Pinto Correia, Helena Marques, Hélia Correia, Isabel Barreno, Julieta Monginho, Lídia Jorge, Luísa Costa Gomes, Luísa Dacosta, Mafalda Ivo Cruz, Maria Velho da Costa e Teolinda Gersão.

Na área do ensaio, as participações são de Ana Gabriela Macedo, Clara Rocha, Fátima Freitas Morna, Helena Buescu, Isabel Allegro Magalhães, Laura Bulger, Maria Alzira Seixo, Maria de Fátima Marinho, Maria de Lurdes Sampaio, Maria Irene Ramalho, Maria João Reynaud, Paula Morão e Rosa Maria Martelo.
Edições Afrontamento, Porto 2001
Algumas poetas e ficcionistas portuguesas
contemporâneas
Adília lopes
Ana Hatherly
Ana Luisa Amaral
Clara Pinto Correia
Fátima Maldonado
Helga Moreira
Hélia Correia
Isabel de Sá
Lídia Jorge
Mafalda Ivo Cruz
Maria Teresa Horta
Maria Velho da Costa
Yvette Centeno

























































































segunda-feira, 10 de agosto de 2009




Considerações sobre um poema de JORGE DE SENA
Joaquim Manuel Magalhães

OS DOIS CREPÚSCULOS - Sobre poesia portuguesa actual e outras crónicas

(...) Em Sobre Esta Areia...oito meditações sobre o Pacífico, o seu último volume de poemas até esta data, anuncia uma visão das relações dos corpos, uma superação dos recalcamentos colectivos, uma referência à multiplicidade do amor que culminam as suas várias narrativas sobre a multiforme explosão do prazer, o qual é um dos núcleos mais tensos da atenção humana e literária da nossa época. No passo a seguir transcrito, vêem-se dois corpos de homem e outro de mulher que entre si tivessem distribuído o que de prazer os corpos podem alcançar em habituação sexual, que lhes permite estar juntos como que depois das marcas do desejo.
É um poema sobre quase todo o amor. Sobre, também, o olhar sem repressão. Sobre a justa medida que existe «entre o passado e este presente». Californiano embora, mas mandado em poema para onde se teme viver. (...)
Editora, A Regra do Jogo, Lisboa, 1981

Jorge de Sena

Capa da edição bilingue (póstuma) de Sobre Esta Praia... Oito Meditações à beira do Pacifico (1979), cuja primeira edição em Português foi publicada pela Editorial Inova, em 1977.


Poema de JORGE DE SENA



Deitados no sabor de ao sol queimarem

o mais oculto de si mesmos são

dois jovens e uma jovem misturados.

Um dos rapazes se recosta contra o corpo

do outro rapaz que alonga dorso e pernas,

enquanto neste se debruça e dobra,

pendendo os frescos seios e os cabelos,

o corpo feminino associado aos de ambos.

Mas nada indica excitação nos machos

de quem se pousa o sexo ou distendido pende

em de sereno indiferente como

a só vazia de ausência mistério

que a corpos dava um fervor quente e humano.

São, como deuses, animais sem cio?

Ou são, como animais, humanos, que se aceitam?

Ela é de quem? De um deles só, dos dois?

Um deles será dela mas também do outro?

Será cada um dos três dos outros dois?

Ambos os machos serão fêmeas do outro?

Ou sou um deles? Qual dos dois? O que

sentado se recosta? O que deitado

aceita contra o seu corpo recostado?



Sobre Esta Praia... Oito Meditações à beira do Pacifico (1979), cuja primeira edição em Português foi publicada pela Editorial Inova, em 1977.