quarta-feira, 9 de setembro de 2009












Quadro de Isabel de Sá, acrilico e colagem s/tela, 2008

Paulo da Costa Domingos
Fragmento de NARRATIVA
frenesi, Lisboa, 2009
(...)
À escala da Via Láctea, mais nos vale ficar quietos. Ouvir com atenção uma sonata de Schubert (D821), sentida por Rostropovich e Britten: ou voltar a Elizabeth Wallfisch/Richard Boothby/Robert Woolley (LA Folia). Não mais poderei dizer, como Baudelaire, referindo-se à sua meninice, «eu era tão alto como um in-fólio», nem como Cervantes, que «passo as noites em claro e os dias na escuridão». De idêntico modo é-me impossível garantir-vos que, para melhor, deviéis tudo abandonar, num quietismo necessariamente comprometido com as forças trabalhadeiras da morte. Entendo que vos seja possível sentir já o cansaço de uma pertinência de que, porventura, não partilhais; e que nada tereis colhido, pois, na leitura. »De facto, o que escrevi não contém, em particular, nenhuma pretensão a novidade», até Wittgenstein o disse em Viena; mas permiti-me - filhos, netos, bisnetos da guerra civil intermitente, enfants perdus a quem Shakespeare exortaria: Ah, como a vida é breve; se vivemos, vivemos para derruir o que nos oprime»-,(...)
Olho-te e penso naquele poeta que fala da loneliness of much beauty. Quantas vezes nos sentimos extraordinariamente sós embora sentindo-nos felizes. O amor é impossível mesmo quando possível.
Ana Hatherly

Um livro abandonado numa prateleira é uma munição desperdiçada.

Henry Miller