segunda-feira, 14 de julho de 2014

Violette Leduc


Filme sobre Violette Leduc

« “Sou um deserto que fala sozinho”, escreveu-me Violette Leduc um dia, numa carta. Pois encontrei nesses desertos inúmeras belezas. Além disso, os que vêm falar-nos do fundo da sua solidão, de nós próprios falam. Por mais mundano ou combativo que seja, todo o homem tem subterrâneos onde ninguém ousa penetrar, nem mesmo ele; mas que existem: a noite da infância, os desaires, as renúncias, a súbita comoção de uma nuvem em pleno céu. Surpreender uma paisagem, um ser, tal como existem na nossa ausência: sonho impossível que acalentamos todos.»
Simone de Beauvoir, no prefácio a “La Bâtarde”, citada por Aníbal Fernandes em “VIOLETTE, colagem ou quase”, prefácio à sua tradução de “Teresa e Isabel”.
VIOLETTE, o filme de Martin Provost.

domingo, 15 de junho de 2014

Fragmento do romance As Luzes de LEONOR de Maria Teresa Horta

(...) A negares-te ao preceito, ao preconceito, à mansidão, empurrando de ti a maciez, a brandura temperada, tão imprudente filha embora mulher feita, a recusares o bordado para escolheres a pena e com ela abrindo a alma. Desse modo fugindo, correndo, voando na rebeldia desde sempre, dando medo ou provocando espanto, como sentiam as freiras de Chelas diante de teus dizeres e desatadas ousadias, cabelos soltos para ires à grade onde ficavas sorrindo, namorando, inventando versos. E muito me ralava então o teu riso subido, recitando poesias como quem porfia destacar-se, a exibires o saber pelo avesso do trato da humildade.
Não te entendia na altura e nem percebo agora o que busca a minha filha, o que ganha opondo-se a seu Pai. A invocares teus direitos Leonor como se foras homem, negando-te a aceitar como certo o que te parece errado, filha insubmissa, a negares pergaminhos de sangue e costumes herdados, exigindo em troca aquilo a que chamas novo, moderno ou mudança, invocando em teu auxílio estudos, filosofias e leituras. E quebrada a haste da inocência da mente, invocas a glória e a felicidade, impões tuas distâncias, acendes tuas luzes, recusando submeteres-te a qualquer autoridade.
Demasiado depressa vais tu preferindo os becos sem saída, no tomar dos atalhos, no escolher das veredas e das subidas íngremes, rolando nas descidas inclinadas, bebendo das cisternas e das fontes inquinadas, no infringir de princípios, regras e maneiras, aproveitando mal a educação que te foi dada. Mas ensinada pela vida a não desistir, volto a pedir-te, filha: adoça teus propósitos, entreabre a guarda, as grades, amansa teus modos, ameniza teu sorriso e maneja a ternura, pede a teu Pai perdão do desacato feito; deixa menina que te sejam colocadas as algemas, as vendas, as mordaças e desse modo  mais fácil será ceder, Leonor, retrocede um pouco, ganha o feminil entendimento da docilidade, retoma o norte, a memória da casa, como se foras donzela tecendo o fio do teu cabelo. (...)

Monólogo de Leonor de Lorena

Prémio Consagração de Carreira da Sociedade Portuguesa de Autores para Maria Teresa Horta. Este ano, em Maio.Parabéns!


terça-feira, 6 de maio de 2014

Álbum de Fotografias Portugal 1969-1979 - MIRA FORUM. Martins Lhano, artista plástico e pai de Graça Martins e Isabel Lhano. Foto de 1971. Exposição de Martins Lhano, Galeria Arte Nova, Porto.


Isabel Lhano e Graça Martins


Isabel de Sá e Isabel Lhano


Graça Martins e Susana Menezes, ex- aluna e agora actriz lisboeta!


Isabel Lhano (irmã de Graça Martins), na foto uma projecção recolhida na Pide, quando esteve detida 24 horas por distribuir folhetos no Liceu António Nobre para uma convocatória de estudantes.


Na foto Manuela Matos Monteiro, a principal impulsionadora da Exposição Álbum de Fotografias Portugal 1969-1979, através da rede social Facebook, para a recolha de fotos de uma década, antes e depois do 25 de Abril e Graça Martins. No centro uma foto de Artur (namorado de Graça Martins) com Graça Martins, quando era adolescente e estudante na Faculdade de Belas Artes do Porto, 1972. O ESPAÇO MIRA é um projecto de Manuela Matos Monteiro e João Lafuente e situa-se na zona Oriental da cidade do Porto. Um agrupamente de 11 espaços (antigos depósitos de carvão, perto da estação de Campanhã) dedicados a projectos relacionados com Arquitectura, Arte Contemporânea, Fotografia, Cinema, Artes Performativas, etc.


Graça Martins e José Carlos Teixeira (autor da foto), no centro a foto de 1972. O Beijo do namorado Artur a Graça Martins, aluna do 1ºano da Faculdade de Belas Artes do Porto. José Carlos Teixeira também era aluno da Faculdade de Belas Artes do Porto. Dar um Beijo em público, em 1972 implicava ser convidada a sair do local, expulsa ou Multada!


Uma das fotos seleccionada pelo jornal Público para o destaque sobre a Exposição de fotografias de uma Década em Portugal. 1969-1979. Espaço MIRA FORUM. Na foto o BEIJO de Artur a Graça Martins, 1972. Foto da autoria de José Carlos Teixeira.


Curadora Eglantina Monteiro. Álbum de Fotografias Portugal 1969 -1979

A 26 de Abril O MIRA FORUM fez um apelo no facebook pedindo fotografias da década de 1969-1979 em Portugal, para com aquele material fazer uma exposição que desse a ver como se vivia então neste país. Um olhar contemporâneo sobre a década mais decisiva da história recente de Portugal a partir do olhar das pessoas comuns sobre o seu próprio mundo - um tributo aos 40 anos do 25 de Abril.
 
Trata-se da década da contestação interna, e da reflexão da sociedade sobre si própria, questionando os valores das instituições em geral e da guerra colonial em particular a revolta estudantil de 1969, um ano após o Maio de 68 (...) As canções de protesto, as canções contra a guerra, os cabelos compridos, a liberdade sexual, o uso de estupefacientes e a forma de se vestirem - dos "blusões pretos" aos "teddy-boys", passando pelos "beatniks" e os "hippies" - eram as manifestações mais estridentes da recusa radical das novas gerações -intelectuais e artistas em articulações mais ou menos efectivas com as comissões de moradores e o operariado mais esclarecido - à sociedade de que eram herdeiros. Os objectivos de aspiração desta geração opunham-se ao dos seus progenitores, deslumbrados com o automóvel, os electrodomésticos e as férias. A crítica das novas gerações ao paradigma do crescimento continuado e da evolução tecnológica à custa da apropriação de recursos naturais inesgotáveis, do trabalho do colonizado e das classes analfabetas do campo ou recém-urbanizadas, estendia-se agora ao modo como esta mesma sociedade passara a organizar também o não trabalho. A crítica às formas estereotipadas de distracção e cultura denuncia as novas indústrias da comunicação e o controlo que estas exercem sobre os indivíduos - os programas de televisão, de férias, etc.
 
As novas gerações criticaram a sociedade de consumo, alienatória na medida em que o indivíduo não pode desenvolver as suas capacidades criadoras, o stablishement crítica e receia os comportamentos evasivos e alienados dos jovens que se organizam em comunas regidas por outras formas sociais.
De uma maneira ou de outra, toda a sociedade projectava mudanças. Implicava-se.
 
Eglantina Monteiro
Porto, 19 de Abril 2014
(Catálogo da Exposição Álbum de Fotografias Portugal 1969-1979, MIRA FORUM).
 

Álbum de Foptografias Portugal 1969-1979 - MIRA FORUM 2014