domingo, 17 de agosto de 2008


Imateriais os teus olhos perseguem-me, próximos do mar. E se em ti o Sol se põe, quero entardecer, na superfície húmida da tua pele.O arrepio de ti, o olhar que o prolonga. Tens os meus versos loucos. Palavras sujas. As trevas que a luz não cura.

João Borges, 2008

Este foi o nosso último abraço. E quando,
daqui a nada, deixares o chão desta casa
encostarei amorosamente os lábios ao teu copo
para sentir o sabor desse beijo que hoje não
daremos. E então, sim, poderei também eu
partir, sabendo que, afinal, o que tive da vida
foi mais, muito mais, do que mereci.

Maria do Rosário Pedreira



Caminhas na praia. As sandálias nas dunas
junto à erva agreste de outros dias. O sol
não te queima, não te fere os olhos ao meio-dia.
Soletramos o amor com a letra mais pequena de uma língua
acabada de inventar. Sabem as gaivotas. Sabe o mar.
Era uma vez. Era assim que te agasalhava a noite
e me enrolava nos teus olhos para encontrar
a luz. Não é com a memória que caminho.
As manhãs são de névoa como as camarinhas
que cresciam nas dunas. Com quem posso
agora falar de camarinhas? Saborear o gosto
das bagas e dos risos. Vamos apanhando conchas,
castelos, príncipes, borboletas. Vamos perdendo
o que encontramos. As mãos vazias. Os passos leves.
Os olhos crescem como a erva nas sandálias.

Rosa Alice Branco, Desfocados pelo vento, Quasi Edições, 2004