domingo, 12 de outubro de 2008

Poema de Herberto Helder

na morte de Mário Cesariny

corpos visíveis,
nobilíssimos,
inseparável luz que move as coisas,
ter um inferno à mão seja qual for a língua,
toda a água é inocente e escoa-se entre as unhas,
à porta do forno crematório alguém lhe toca,
vai lá, vai que te acolham, brilha, brilha muito, brilha tanto
/quanto não possas,
brilha acima,
faz brilhar a mão que melhor redemoinha,
a mão mais inundada,
e ele entra sem esperança nenhuma,
só na última linha quando o coração rebenta,
reconhece quem o olha

Herberto Helder , A Faca Não Corta o Fogo
(súmula & inédita)", 2008, Assírio & Alvim