8 de Março - o tal Dia da MulherConsiderada desde sempre um homem falhado, ser ocasional, ser relativo, vivendo num mundo de homens em relação aos quais é definida por falta de qualidades, cumprindo as suas (deles) leis, voluntária ou involuntáriamente educada desde a mais tenra idade para a sua função de matriz, a mulher trava hoje uma irreversível luta de libertação, tanto mais difícil quanto não há nela a consciência de classe que torna solidários os negros, os proletários ou os judeus.
Com efeito, e usando as palavras da própria Simone de Beauvoir, «as mulheres vivem dispersas entre os homens, ligadas pelo habitat, pelo trabalho, pelos interesses económicos, pela condição social, a certos homens - pais ou maridos - mais intimamente do que às outras mulheres. Burguesas, são solidárias dos homens burgueses e não das mulheres proletárias; brancas, dos homens brancos e não das mulheres negras...»
Salvo raras excepções, só muito raramente a mulher tomou consciência de que a sua singularidade face ao homem não era um defeito mas tão- somente uma diferença.
Para essa tomada de consciência muito contribuiu a publicação em França de O Segundo Sexo, (Simone de Beauvoir) numa altura em que os movimentos feministas se limitavam a exigir o direito de voto ou a igualdade de salários, sem pôr em causa o problema muito mais profundo da condição feminina, que, para Simone de Beauvoir, não é inerente à natureza biológica da mulher, mas fundamentalmente imposta pela sociedade.
Portanto, exigir o reconhecimento da mulher como ser inteiro, responsável e livre é de tal modo revolucionário que põe em causa os próprios fundamentos da sociedade.
de O Segundo Sexo, Livraria Bertrand, 1975, tradução de Sérgio Milliet