segunda-feira, 28 de dezembro de 2009


O coração tem razões que a própria razão desconhece. Com a leitura de Paixões – Amores e Desamores que Mudaram a História, pode-se dizer que o amor e o ódio, querendo ou não, são os combustíveis de todos nós, dos mais nobres aos mais vagabundos dos corações. Amar ou não Amar, eis a questão my friend Sheakspeare.

PAIXÕES - ROSA MONTERO

Alguns dos pares famosos analisados por Rosa Montero - Tolstói e Sônia, Oscar Wilde e Sir Douglas, Verlaine e Rimbaud, Joana e Filipe.

TOLSTOI e SÓNIA


LEON E SÓNIA TOLSTOI
Escritor famoso, autor de Guerra e Paz e Ana Karenina, Leon viveu mais em guerra do que em paz com a sua mulher. Tinha 34 anos quando se casou com Sónia, de 18, numa cerimónia feita à pressa. Tolstoi sempre foi terrivelmente contraditório: anjo e fera, génio e miserável. Era bissexual e bebia muito. Até se casar, contraiu doenças venéreas de várias mulheres de vida fácil, amava platonicamente alguns homens e manteve uma tórrida relação com uma das suas camponesas, mulher casada com a qual teve um filho. Entre o noivado e o casório passaram-se apenas sete dias. No decorrer dessa mesma semana Tolstoi teve a cruel e original idéia de que a noiva lesse todos os seus diários íntimos, para saber com quem estava a casar-se. E a pobre Sónia, ainda uma menina, teve que engolir as escabrosas revelações de um senhor de 34 anos que mal conhecia. Ficou horrorizada. Após o casamento, foram morar em dois pavilhões apertados, imundos e escuros, sem tapetes, invadidos por ratos e com o jardim devorado pelas ervas daninhas. As dívidas de jogo de Leon haviam consumido a bela mansão de 36 quartos.
Sónia ficou grávida 16 vezes, sofreu três abortos e quatro dos 13 filhos que teve, morreram. Viveu o inferno do tolstoísmo. Aos 49 anos, Tolstoi mergulhou numa profunda crise de depressão. Tinha idéias suicidas e não via sentido na existência; até que decidiu criar uma nova religião, o tolstoísmo, e tornou-se uma espécie de guru pregando coisas como a abstinência sexual. Tudo adubado por furiosos sermões e iradas censuras, porque Tolstói transformou-se num fanático intolerante que imputava aos outros (sobretudo à mulher) as suas próprias falhas. Sónia enfrentou ainda o discípulo Chértkov que teve Tolstoi nos braços no leito de morte.
Por mais de duas décadas a mulher de Tolstoi tentou pôr ordem e sensatez no delírio: "O meu marido deixou absolutamente tudo sobre as minhas costas", escreveu lucidamente no seu diário, os filhos, a fazenda, a casa, os seus livros, os problemas económicos, o contacto com as pessoas e com os editores, e depois, com uma indiferença egoísta e críticas, despreza-me por eu fazer tudo isso. Mas, se o louco não era tido como tal, então ela, Sónia, o que era? Pouco a pouco foi perdendo a noção do real. Se o louco não estava louco, então a louca era ela.
Sónia perde a razão e entrega-se a comportamentos histéricos e paranoicos. Durante as várias crises, atirou-se para uma represa gelada, tentar atirar-se a um poço e golpear o próprio peito com um martelo. A sanidade só voltou com a morte do marido. Sónia administrou as propriedades da família, começou a escrever as suas memórias e visitava todos os dias o túmulo do marido, onde depositava flores até à sua morte.

OSCAR WILDE E SIR DOUGLAS


OSCAR WILDE E LORDE ALFRED DOUGLAS
A decadência na vida do escritor inglês Oscar Wilde foi resultado da sua obsessão pelo lorde Alfred Douglas, um jovem de 21 anos ''maldoso, egoísta, vaidoso, frívolo e violento'' que levou Wilde, então com 37 anos, a um mundo de chantagistas. Bosie, como Douglas era chamado por todos, usou o amante na sua luta pessoal contra o pai. Numa briga judicial, Wilde terminou preso e com os bens expropriados - e socialmente desmoralizado até morrer, aos 46 anos
Antes de ceder à homossexualidade e terminar a vida com uma paixão decadente, Oscar Wilde teve algumas namoradas e casou-se, aos 29 anos, com Constance Lloyd, ''uma mulher bonita, inteligente e leal, três anos mais nova que ele''. Segundo testemunhos, no começo de seu casamento Wilde estava muito apaixonado. ''Devia sentir-se feliz ao imaginar-se curado da sua homossexualidade: a vida era muito mais confortável na ortodoxia.'' Teve dois filhos com Constance, mas ''a mulher-mãe" transformou-se para ele num objecto sexual impossível de suportar: "Quando casei, a minha esposa era uma rapariga bonita, branca e esbelta como um lírio. (...) Depois de um ano, transformou-se numa coisa pesada e disforme (...) com seu espantoso corpo inchado e doente por culpa do nosso acto de amor.''' No entanto, sempre se trataram bem e mantiveram-se unidos. Três anos depois do casamento, Robert Ross, um rapaz de 17 anos e já experiente nesses assuntos, seduziu Wilde, então com 32 anos e levou-o para a cama. ''Enquanto o sexo com as mulheres lhe parecia sujo, o amor viril encerrava para Wilde toda a beleza, a espiritualidade e a transcendência.''.
Passada a paixão inicial, o encantador Ross tornou-se o seu melhor amigo (...) A partir de 1891, estreou em Londres quatro peças de teatro com crescente sucesso, até chegar ao triunfo total da sua última comédia, "A importância de ser Ernesto". Essa obra estreou em 1895 e recebeu críticas fabulosas; três meses depois, Wilde era preso. Tudo havia começado em 1891; foi então que Wilde conheceu lorde Alfred Douglas. Era o começo da sua decadência.

VERLAINE e RIMBAUD


PAUL VERLAINE E ARTHUR RIMBAUD
Verlaine já era um poeta famoso quando os dois se conheceram. Era feio, beberrão e violento, mas os seus versos tinham a chave certa para abrir as portas da alma. A mãe pensou em acalmá-lo da sua bissexualidade quando o casou com Mathilde, uma jovem linda de 17 anos. Nada mudou. Continuou a fazer versos excepcionais, mas batia na mulher, bebia muito e uma vez tentou matar a mãe. Tinha 27 anos quando conheceu Rimbaud, um belíssimo rapaz que fugiu de casa várias vezes e em algumas delas dormiu na rua e vasculhou lixo para encontrar comida. Morava no povoado de Charleville e lia Verlaine. Um dia escreveu-lhe uma carta com alguns dos seus poemas e o desejo de mudar-se para Paris. Verlaine aceitou a visita do jovem poeta e, juntos, passaram a viver o inferno.
Paul Verlaine vivia entre o amor violento e cruel de Rimbaud e o da sua mulher Mathilde. A vida aos pedaços, mas a poesia dos dois era tão forte quanto a obsessão que os unia. Foram ficando isolados à medida em que o relacionamento dos dois se tornava cada vez mais público devido à instabilidade. Resolveram separar-se. Voltaram. Foram morar para Londres. Romperam novamente. Verlaine vai para Bruxelas e implora uma visita do amigo. O descontrole fala mais alto e, depois de muito sexo, bebidas e brigas, Verlaine com um revólver em seu poder, atira em Rimbaud. A mãe de Verlaine acode o rapaz e acalma o filho. Decidem levar Rimbaud de volta para a estação para que ele regresse a Londres imediatamente. Na despedida Verlaine tenta mais uma vez matar o amante. É preso e condenado a dois anos de trabalhos forçados. Os dois continuaram vivos, mas a poesia para eles já estava morta.

JOANA e FILIPE


JOANA, A LOUCA, E FILIPE, O BELO
Neurótica, a princesa espanhola protagonizou cenas inesquecíveis em nome da paixão pelo seu marido, Filipe, o Belo: talhou o rosto de uma suposta amante do marido, para em seguida ser trocada por ele. Quando Filipe morreu prematuramente, aos 28 anos, Joana endoidou de vez e proibiu que qualquer mulher se aproximasse dos restos mortais. Contam que Joana mandou desenterrar o príncipe, que havia sido sepultado na abadia de Miraflores, e que ia vê-lo todas as semanas, abrindo o caixão, desamarrando o sudário e beijando os pés do defunto. E depois que, quando a peste a obrigou a sair de Burgos, levou consigo o cadáver de Filipe.
Durante o casamento, Filipe enganou e desrespeitou cada vez mais abertamente a sua mulher, e Joana, como era hábito, foi ficando mais e mais obcecada por ele. O arquiduque deixava-a trancada nos seus aposentos durante semanas, e ela passava a noite golpeando as paredes para irritar as companhias do marido.
A última rainha titular da história da Espanha morreu no fim de 1555, paralítica da cintura para baixo e atormentada pelas dores horríveis da gangrena. Tinha 77 anos e havia passado os últimos 47 encerrada em Tordesilhas.