domingo, 10 de junho de 2012
Poema de João Borges
Canção diante de uma porta fechada*
I
O começo do inverno trocou em chuva todas as coisas que ainda não disse. Tenho um projecto interminável para me convencer de que vale a pena este quarto vazio, este silêncio.
Diante de uma porta fechada, estou sentado e canto. Para a chuva, para o que está do outro lado.
Voltei para casa, seja isso onde for. Os fantasmas assombram os mesmos cantos do quarto, e a paisagem através da janela não se moveu ainda.
Este segredo
neste livro, mas sei que não posso perpetuar a conversa, porque me canso de ouvir só a minha voz.
Para continuar.
Para mim, só dessa maneira fazia sentido ter feridas, dizer que me magoara, porque antes nem havia sangue suficiente para assim escorrer em abundância.
Não sabia,não podia saber, que a verdadeira dor e as feridas irreversíveis são limpas, sem sangue a escorrer nem pele esfolada para desinfectar com~álcool e betadine.
Agora sei.
in Brilho no Escuro nº3, edições Anjo da Guarda, Porto, 2009
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