domingo, 7 de setembro de 2014

Virginia Woolf



Palavras de Monique Nathan sobre Virginia Woolf

"De sua mãe herdou Virginia Woolf um belo e regular rosto oval que teria tentado os últimos pré-rafaelitas, a fronte alta, um nariz fino e olhos admiráveis, profundamente recolhidos nas órbitas: beleza bastante fria, que os a...migos facilmente comparavam à de uma madona gótica. Mas tudo se animava logo que Virginia começava a falar. Ouvia-se de súbito sair da cadeira onde estava sentada uma voz divertida, tão instável como a de uma criança de escola, cada vez mais aguda até à repentina gargalhada, que a fazia lançar-se para trás e não tardava a contagiar toda a assembleia.
Com o tempo e a doença, a pureza dos seus traços viu-se alterada, mas a sua extrema mobilidade não mudou. Dois anos antes da sua morte, quando Marguerite Yourcenar, encarregada da tradução francesa de As Vagas, trava conhecimento com ela, não resta já «nesse pálido rosto de Jovem Parca, recentemente envelhecido mas delicadamente marcado pelos sinais do pensamento e do cansaço» senão uma boca que parece nunca ter sabido sorrir e um olhar desolado.
O que impressiona ainda, perante tanta devastação, é o jogo de uma sensibilidade à flor da pele. A vista é, de todos os sentidos, o mais agudo. Centro perceptivo sempre alerta, vai respigando o seu prazer enquanto o cérebro dormita. Não mergulha, desliza pela superfície das coisas, «porque a vista possui esta estranha propriedade: poisa unicamente na beleza; como uma borboleta, procura a cor e alegra-se ao sol». Virginia Woolf é, antes de mais, este olhar ocioso sobre o mundo. Tal como num quadro de Cézanne ou de Braque, a cor nos provoca, nos estimula, aqui a vista fertiliza o espírito, faz surgir as imagens e as palavras e nascer a metáfora das profundidades do nosso inconsciente."

Monique Nathan, Relógio D'Água.