(...) A negares-te ao preceito, ao preconceito, à mansidão, empurrando de ti a maciez, a brandura temperada, tão imprudente filha embora mulher feita, a recusares o bordado para escolheres a pena e com ela abrindo a alma. Desse modo fugindo, correndo, voando na rebeldia desde sempre, dando medo ou provocando espanto, como sentiam as freiras de Chelas diante de teus dizeres e desatadas ousadias, cabelos soltos para ires à grade onde ficavas sorrindo, namorando, inventando versos. E muito me ralava então o teu riso subido, recitando poesias como quem porfia destacar-se, a exibires o saber pelo avesso do trato da humildade.
Não te entendia na altura e nem percebo agora o que busca a minha filha, o que ganha opondo-se a seu Pai. A invocares teus direitos Leonor como se foras homem, negando-te a aceitar como certo o que te parece errado, filha insubmissa, a negares pergaminhos de sangue e costumes herdados, exigindo em troca aquilo a que chamas novo, moderno ou mudança, invocando em teu auxílio estudos, filosofias e leituras. E quebrada a haste da inocência da mente, invocas a glória e a felicidade, impões tuas distâncias, acendes tuas luzes, recusando submeteres-te a qualquer autoridade.
Demasiado depressa vais tu preferindo os becos sem saída, no tomar dos atalhos, no escolher das veredas e das subidas íngremes, rolando nas descidas inclinadas, bebendo das cisternas e das fontes inquinadas, no infringir de princípios, regras e maneiras, aproveitando mal a educação que te foi dada. Mas ensinada pela vida a não desistir, volto a pedir-te, filha: adoça teus propósitos, entreabre a guarda, as grades, amansa teus modos, ameniza teu sorriso e maneja a ternura, pede a teu Pai perdão do desacato feito; deixa menina que te sejam colocadas as algemas, as vendas, as mordaças e desse modo mais fácil será ceder, Leonor, retrocede um pouco, ganha o feminil entendimento da docilidade, retoma o norte, a memória da casa, como se foras donzela tecendo o fio do teu cabelo. (...)
Monólogo de Leonor de Lorena
Não te entendia na altura e nem percebo agora o que busca a minha filha, o que ganha opondo-se a seu Pai. A invocares teus direitos Leonor como se foras homem, negando-te a aceitar como certo o que te parece errado, filha insubmissa, a negares pergaminhos de sangue e costumes herdados, exigindo em troca aquilo a que chamas novo, moderno ou mudança, invocando em teu auxílio estudos, filosofias e leituras. E quebrada a haste da inocência da mente, invocas a glória e a felicidade, impões tuas distâncias, acendes tuas luzes, recusando submeteres-te a qualquer autoridade.
Demasiado depressa vais tu preferindo os becos sem saída, no tomar dos atalhos, no escolher das veredas e das subidas íngremes, rolando nas descidas inclinadas, bebendo das cisternas e das fontes inquinadas, no infringir de princípios, regras e maneiras, aproveitando mal a educação que te foi dada. Mas ensinada pela vida a não desistir, volto a pedir-te, filha: adoça teus propósitos, entreabre a guarda, as grades, amansa teus modos, ameniza teu sorriso e maneja a ternura, pede a teu Pai perdão do desacato feito; deixa menina que te sejam colocadas as algemas, as vendas, as mordaças e desse modo mais fácil será ceder, Leonor, retrocede um pouco, ganha o feminil entendimento da docilidade, retoma o norte, a memória da casa, como se foras donzela tecendo o fio do teu cabelo. (...)
Monólogo de Leonor de Lorena