segunda-feira, 8 de setembro de 2008

PAUL KLEE

Jardins da Tunísia


8 de SETEMBRO 8 de SETEMBRO

Poema de ISABEL DE SÁ

A Bola Multicolor

No dia em que completei oito anos
de idade e a nossa criada
me deu de presente uma bola multicolor,
corri pela praia sentindo a leve brisa
de Setembro. E dessa manhã ficou
no álbum a fotografia
que raramente vejo.

O vento na folhagem, no caule das flores,
a voz de crianças. E tu sobre a folha
desenhando o retrato
daquele que escreveu Indícios de Oiro.
SETEMBRO SETEMBRO SETEMBRO

Poema de WALT WHITMAM

Por Caminhos Não Percorridos

Por caminhos não percorridos,
Pela vegetação das margens das lagunas,
Fugindo da ostensiva vida,
De todas as normas já promulgadas, dos prazeres, benefícios, convenções
Tudo isso com que, demasiado tempo, alimentei a minha alma,
Convencido enfim de que as normas ainda promulgadas, convencido de que a minha alma,
De que a alma do homem por quem falo descobre a alegria nos companheiros,
Aqui, a sós, longe do tumulto do mundo,
Em harmonia com as aromáticas línguas que me falam,
Sem envergonhar-me mais (pois neste lugar distante, como em nenhum outro posso
abandonar-me
Entregue à vida que não se revela ainda que tudo contenha
Decido-me hoje a cantar apenas os cantos de viril afecto,
Projectando-os ao longo da plena vida,
Legando, desde já, as formas de másculo amor,
Pela tarde deste delicioso Setembro dos meus quarenta e um anos,
Dirijo-me a todos os homens que são ou foram jovens,
Conto-lhes o segredo das minhas noites e dos meus dias,
Celebro a necessidade de companheiros.

SETEMBRO E POEMAS QUE FALAM DE SETEMBRO

Poema de RUY BELO

O Testamento de Elvira Sanches

Relatório de Contas

Setembro é o teu mês, homem da tarde
anunciado em folhas como uma ameaça
Ninguém morreu ainda e tudo treme já
Ventos e chuvas rondam pelos côncavos dos céus
e brilhas como quem no próprio brilho se consome
Tens retiradas hábeis, sabes como
a maçã se arredonda e se rebola à volta do que a rói
Há uvas há trigo e o búzio da azeitona asperge em leque o som inabalável
nos leves ondulados e restritos renques das mais longínquas oliveiras conhecidas
Poisas sólidos pés sobre tantas traições e no entanto foste jovem
e tinhas quem sinceramente acreditasse em ti
A consciência mói-te mais que uma doença
reúnes em redor da casa equilibrada restos de rebanhos
e voltas entre estevas pelos múltiplos caminhos
Há fumos névoas noites coisas que se elevam e dispersam
regressas como quem dependurado cai da sua podridão de pomo
Reconheces o teu terrível nome as rugas do teu riso
começam já então a retalhar-te a cara
Despedias poentes por diversos pontos realmente
És aquele que no maior número possível de palavras nada disse
Comprazes-te contigo quando o próprio sol
desce sobre o pátio e passa tantas mãos na pele dos rostos que tiveste
Repara: não esbarras já contra a cor amarela?
Setembro na verdade é mês para voltar
Podes tentar ainda alguns expedientes respeitáveis
multiplicar diversas diligências nos ameaçados cumes dos outeiros
ser e não ser fugir do rótulo aceitar e esquivar o nome fixo
E no entanto é inevitável: a temperatura descerá mais dia menos dia
Calas-te então cumprido como um rosto e puxas toda a tarde
sobre esse corpo que se estende e jaz
Andaste de lugar para lugar e deste o dito por não dito
mas todos toda a vida teus credores saberão onde encontrar-te
pois passarás a estar nalguma parte
Tens domicílio ali que a terra sobe levemente
e toda a tua boca ambiciosa sabe e sente quanto barro encerra