sábado, 22 de novembro de 2008

Poema de João Borges

DETONAÇÃO

De repente a luz branca
cobriu
as casas.
Um segundo isolado no tempo:
detonação

Senti toda a cidade
estremecer.
Relembrei cada rua
onde a distância
preenche os nossos passos, as palavras,
a escuridão
a dois, da mesma boca
o beijo e os poemas. Mas é agora
cruel e despida
a realidade. Nunca soube encarar
confesso,
a forma como
me sorrias, a superfície quente do teu corpo,
a frieza dos teus lugares
e mais que tudo
a imobilidade do teu amor.

Neste mundo escuro e destruído
devo caminhar
pelas canções tristes,
pelas tardes cinzentas.
Pela consequência da explosão. Não é
mentira
quando te digo
que não perco tempo a chorar:
o choro és tu.
Chorar
é não esquecer cada uma
das camas em que me deste vida, cada um
dos sítios onde o teu amor
traía os dias.

Doeu-me ver despertar
o que dentro de mim dormia
mas nada mais
me doi.
Nem o abandono ao deserto.

Vejo a claridade algures
num céu longínquo
e não quero ficar neste lugar
onde o sangue me seca
as mãos
e cardos me ferem
o corpo.

5 comentários:

[A] disse...

"cada uma
das camas em que me deste vida"

_





A poesia não se entrega a quem a define - Mario Quintana

Graça Martins disse...

A poesia não se define, nem se entrega, VIVE-SE...Só depois da vivência é que nasce a poesia.
Não acha?
Um beijo

[A] disse...

Sim Graça, acho que sim.
Às vezes a dificuldade em entender verdadeiramente algo advém da falta dessa vivência.
Mas há quem tenha uma sensibilidade nata.


Posso colocar um dos poemas do João no meu blogue?

Graça Martins disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Graça Martins disse...

Ana, mas claro que pode retirar do meu blog poemas do João. Já falei com o autor e ele acha bem. A poesia é para se espalhar, como uma semente que deve germinar em vários solos.
Fico feliz por apreciar tanto como eu, a poesia do João Borges.
Estes poemas ainda inéditos já se encontram numa editora de Lisboa. A ver vamos.
Um beijo
Graça