Pascal Bruckner Alain Finkielkraut
O TUMULTO
Amo-te: esta mensagem supostamente primeira é de facto um entrançado de afectos exclusivos e indissociáveis e na sua aparente simplicidade combina o júbilo, a ansiedade, a homenagem e a alergia. (...)
«Amo-te» é antes de mais, é a sua evidência gramatical, uma fórmula afirmativa: proclama um êxtase, afirma um paroxismo, denomina uma felicidade. É também optativo: digo«amo-te» para voltar a ser o «eu» que, desde o meu amor, já não sou, para reintegrar o rubro da intensidade e da substância do qual fui deposto. Falo de um não-lugar - onde deixei de ser; designo um lugar - «tu»- onde o Outro ainda não está, mas onde desejo vê-lo descer. «Amo-te» é portanto uma expressão propiciatória que pede aos prenomes para produzirem pessoas: «eu» revela a nostalgia da interioridade perdida, e «tu» revela o desejo que o objecto amado corresponda a uma identidade. No «amo-te» existe também a veemência do imperativo: ama-me! Ordeno-te que me ames! é preciso que pagues a tua dívida. Meu amor, quer queiras quer não, faz de mim o teu credor: foi um mal, uma ferida que fizeste e que apenas poderás curar aceitando a reciprocidade. Para exigir que me ames, apoio-me no meu amor, exactamente como o debochado, nas instituições sádicas, se apoia no desejo que experimenta para submeter o ser cobiçado. todos os ternos enamorados são sádicos do afecto e a sua confissão de dependência é exigência de reparação.
Finalmente, é preciso perceber o «amo-te» na interrogativa: amas-me? Pergunta-pânico pois é a minha entrada no paraíso que está subordinada à resposta. Ouvir o consentimento, com efeito, far-me-á mudar de mundo.
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