terça-feira, 28 de outubro de 2008
FÉLIX GUATTARI
O anti-édipo
CAPITALISMO E ESQUIZOFRENIA
A Livraria Poetria realiza uma sessão de poesia intitulada "A Arte de Jorge de Sena" no próximo dia 30 pelas 21,30, no Café Progresso, Porto.
Participação e testemunho de António Rebordão Navarro e Sérgio Lopes, sobrinho do poeta.
quarta-feira, 22 de outubro de 2008
DESPOJOS DE UMA TRAGÉDIA DE FREDERICO NIETZSCHE
(...)
Corre a vida sem parar e os melhores amigos não sabem nada um do outro. Não é pequena habilidade viver sem que me deixe dominar pela melancolia. Frequentemente, atravesso estados nos quais quisera contrair um empréstimo com o meu velho, forte, florescente e valoroso amigo Rhodes, estados em que necessitaria duma transfusão de sangue - de sangue de leão e não de cordeiro! - e encontro-me perante o impossível, pois o meu amigo está em Tübingen, casado e rodeado de livros, isto é, inacessível para mim, por todos os motivos. Vejo, então - ai, meu amigo!- que tenho que continuar vivendo à custa das minhas próprias «reservas», ou seja (como sabem todos quantos hajam pretendido fazer idêntica experiência) bebendo o meu próprio sangue. Quando isto acontece, é preciso cuidar de não perder a sede de si mesmo, mas também de não esgotar por completo o rubro licor vital.
(...)
domingo, 19 de outubro de 2008
sábado, 18 de outubro de 2008
quinta-feira, 16 de outubro de 2008
PORQUE SEM BELEZA NÃO SE AGUENTA ESTAR VIVO
Somos tu e eu no inferno do amor.
Limpo a cinza do rosto
sem tocar a morte que o cobre.
Nenhuma experiência é igual a outra.
Dividido, o texto é um destroço.
O abismo iluminado voltou. Matar-me-ás
com beleza, beleza.
O abismo iluminado voltou.
Numa manhã a Morte sorriu.
A criança vagueava. Um homem
de encontro a outro homem na beleza
da folhagem. Serás ele. Ela.
O poema nascia, cristalino.
Não existe saída na escuridão
da página. Quisera alienar-me
com o poema. Celebrar a vida
ou vaguear até ao suicídio.
Ninguém há que seja eu. A beleza
do início fala de um lodaçal
encoberto pela bruma das palavras.
O poema é um acto insurrecto.
Chegada é a hora propícia às sombras.
Do nada estoiram visões. Impossível
esconder o rosto ou fugir ao tumulto.
As palavras agitam-se em filamentos
de luz. O poema transforma
o nosso rosto naquele que desconhecemos.
Necessito de beleza, fortalece-me
a destruição, o desejo.
Ardem as páginas sob o gesto
frio da mão que escreve.
O menino louco. À sua infância
foi dado mais um ser que amou
inteiro. Há uma espécie de anestesia
que é também autismo. Crianças
com seus trajes fúnebres, grinaldas.
Por vezes tudo é ruína.
Esqueci-me das palavras
do passado. Não soube prescindir da beleza.
O teu corpo
agora menos só. Digo-te que desistas.
És desconhecida de ti.
Eram palavras brancas desenhadas a pincel.
Uma menina passou em busca de beleza.
Recolhia desencantos, visões. Nada sabia
do sentido do tempo. Pérolas rolavam
em direcção ao seio da mulher.
Rimo-nos primeiro com essa alegria
do princípio. E a tarde caía como nos romances.
a minha palavra favorita, Edição Jorge Reis-Sá, Centro Atlântico.pt
COMO ESTAVA AZUL, O CÉU
Encontro. A figura refere-se aos momentos felizes que imediatamente se seguiram ao primeiro encantamento, antes de nascerem as dificuldades da relação de amor.
Embora o discurso do amor não seja senão uma poeira de figuras que se agitam segundo uma ordem imprevisível à maneira do voltear de uma mosca num quarto, posso atribuir ao amor, pelo menos retrospectivamente, imaginariamente, uma transformação organizada: é por este fantasma histórico que por vezes me preocupo: uma aventura. A evolução de amor parece então seguir três etapas ( ou três actos) : é, inicialmente, instantaneamente, a captura ( sou seduzido por uma imagem) ; sucedem-se então vários encontros ( combinações, telefonemas, cartas, pequenos passeios) durante os quais «exploro» com embriaguez a perfeição do ser amado, isto é, a inesperada adequação de um objecto ao meu desejo: é a doçura do princípio, o característico período do idílio. Este tempo feliz adquire a sua identidade ( a sua clausura) por oposição (pelo menos na recordação) à «continuação»: a «continuação» é a longa cadeia de sofrimentos, dores, angustias, depressões, ressentimentos, desesperos, embaraços e armadilhas de que sou vitima, vivendo então permanentemente sob a ameaça de uma decadência que atingiria ao mesmo tempo o outro, eu próprio e o prestigioso encontro que nos fez descobrir um ao outro.
Rolland Barthes, Fragmentos De Um Discurso Amoroso
ROLAND BARTHES
FRAGMENTOS DE UM DISCURSO AMOROSO
A solidão do apaixonado não é uma solidão de pessoa (o amor confia-se, fala-se, conta-se), é uma solidão de sistema (talvez porque sou incessantemente abatido pelo solipsismo do meu discurso). Difícil paradoxo: posso ser ouvido por todos (o amor vem dos livros, o seu dialecto é corrente, mas só posso ser escutado (recebido «profeticamente») pelos sujeitos que têm exactamente e presentemente a mesma linguagem que eu. Banquete de Platão -Os apaixonados, diz Alcibíades, assemelham-se aos que foram mordidos por uma víbora: «Não querem, diz-se, falar do seu acidente a ninguém, excepto àqueles que dele também já foram vítimas, por serem estes os únicos capazes de compreender e desculpar tudo o que aqueles ousaram dizer e fazer sob o efeito das dores»: miserável tropa dos «Defuntos famílicos», dos Suicidas de amor ( quantas vezes se não suicida um mesmo apaixonado?), a quem nenhuma grande linguagem ( se não for, fragmentariamente, a do Romance passado) empresta a voz.
quarta-feira, 15 de outubro de 2008
Regresso
As estátuas foram as primeiras a partir. Depois
foi a vez das árvores, dos homens, dos animais. O local
tornou-se deserto. Não havia vento.
Jornais e lixo corriam pelas ruas.
À noite, as lâmpadas acendiam-se sozinhas.
Um homem chegou, deitou um olhar em redor,
tirou uma chave, enterrou-a no chão
como se a devolvesse a qualquer mão subterrânea
ou plantasse uma árvore. Depois ergueu-se, subiu
a escadaria de mármore e demoradamente olhou a cidade.
Uma a uma, com parcimónia, as estátuas regressaram.
Tradução de Eugénio de Andrade
domingo, 12 de outubro de 2008
na morte de Mário Cesariny
corpos visíveis,
nobilíssimos,
inseparável luz que move as coisas,
ter um inferno à mão seja qual for a língua,
toda a água é inocente e escoa-se entre as unhas,
à porta do forno crematório alguém lhe toca,
vai lá, vai que te acolham, brilha, brilha muito, brilha tanto
/quanto não possas,
brilha acima,
faz brilhar a mão que melhor redemoinha,
a mão mais inundada,
e ele entra sem esperança nenhuma,
só na última linha quando o coração rebenta,
reconhece quem o olha
Herberto Helder , A Faca Não Corta o Fogo
(súmula & inédita)", 2008, Assírio & Alvim
sábado, 11 de outubro de 2008
SOBRE MIM A TUA BOCA
Do lodaçal deserto onde
a luz se confunde com o breu,
caminhei à procura do dia.
Cada segundo, uma facada
no coração. O sono fugia
e eu queria matar
o lodo entranhado na minha vida.
Agora, o calor e a luz
secam as lágrimas. Passam
os carros, inteiros são os dias.
A tua boca perfeita
sobre mim
parece a eternidade.