UNDERWATER LOVE
sexta-feira, 26 de março de 2010
quinta-feira, 25 de março de 2010
BRILHO NO ESCURO Nº2
Novas postagens em http://brilhonoescuropoesia.blogspot.com
Palavras repletas de sabedoria, da escritora Yvette Centeno, sobre o Nº2 da revista de poesia Brilho no Escuro, no seu blog LITERATURA E ARTE
http://literaturaearte.blogspot.com
Palavras repletas de sabedoria, da escritora Yvette Centeno, sobre o Nº2 da revista de poesia Brilho no Escuro, no seu blog LITERATURA E ARTE
http://literaturaearte.blogspot.com
Brilho no Escuro:
Há dias assim, dias felizes em que o acaso de uma amizade nos permite o reencontro com artistas que acompanhamos outrora, apreciando a sua inspiração, a independência e originalidade das suas vozes ( obras ) que o tempo, o eterno corruptor, não corrompeu.
Recebo esta revista ( e lamento não ter visto o n.1 e ter vindo a saber que talvez não haja n.3 ) e descubro a mão de Isabel de Sá na ilustração, e poemas seus que me remetem para as edições e ETC. onde desde sempre os marginais, os alheios, os invisíveis dos discursos da moda podiam encontrar um espaço próprio, livre, sem imposições de qualquer espécie; ali se convivia com alguns dos grandes textos que a editora dava a conhecer em traduções pioneiras; ali todos se sentiam bem.
Descubro ainda o Paulo da Costa Domingos, com outro poema, que leio como quem não vê um amigo de longa data, nunca esquecido.
E finalmente uma voz que é jovem, no meio desses mestres da poesia de sempre, João Borges, que espero poder acompanhar por algum tempo, o tempo que me for concedido.
Esta é uma revista de arte, em que poesia e ilustração mutuamente se iluminam, daí o brilho no escuro, a luz no coração vibrante das palavras.
E é um desafio: o da interrogação, como a da Alice no País das Maravilhas, que se procura a si mesma para entender quem é e o que é o mundo à sua volta.
Uma interrogação a que só o artista com a sua arte pode responder, com um Eu Sou - "eu sou", como aquele que exclama, do fundo do universo "eu sou aquele que é ", eu sou o Ser-em-si, o Absoluto, a Essência, o eterno e indestrutível Fundamento da existência que, no seu poema, Isabel de Sá define como Princípio da Realidade.
Uma realidade insubmissa.
Há dias assim, dias felizes em que o acaso de uma amizade nos permite o reencontro com artistas que acompanhamos outrora, apreciando a sua inspiração, a independência e originalidade das suas vozes ( obras ) que o tempo, o eterno corruptor, não corrompeu.
Recebo esta revista ( e lamento não ter visto o n.1 e ter vindo a saber que talvez não haja n.3 ) e descubro a mão de Isabel de Sá na ilustração, e poemas seus que me remetem para as edições e ETC. onde desde sempre os marginais, os alheios, os invisíveis dos discursos da moda podiam encontrar um espaço próprio, livre, sem imposições de qualquer espécie; ali se convivia com alguns dos grandes textos que a editora dava a conhecer em traduções pioneiras; ali todos se sentiam bem.
Descubro ainda o Paulo da Costa Domingos, com outro poema, que leio como quem não vê um amigo de longa data, nunca esquecido.
E finalmente uma voz que é jovem, no meio desses mestres da poesia de sempre, João Borges, que espero poder acompanhar por algum tempo, o tempo que me for concedido.
Esta é uma revista de arte, em que poesia e ilustração mutuamente se iluminam, daí o brilho no escuro, a luz no coração vibrante das palavras.
E é um desafio: o da interrogação, como a da Alice no País das Maravilhas, que se procura a si mesma para entender quem é e o que é o mundo à sua volta.
Uma interrogação a que só o artista com a sua arte pode responder, com um Eu Sou - "eu sou", como aquele que exclama, do fundo do universo "eu sou aquele que é ", eu sou o Ser-em-si, o Absoluto, a Essência, o eterno e indestrutível Fundamento da existência que, no seu poema, Isabel de Sá define como Princípio da Realidade.
Uma realidade insubmissa.
Se a arte
não for insubmissa
se não permanecer
desobediente
e não escapar ao controlo
é o quê ?
Se a arte
não for insurrecta
se não permanecer
pedra viva escaldante
é o quê ?
a arte se não disser Eu Sou ?
não for insubmissa
se não permanecer
desobediente
e não escapar ao controlo
é o quê ?
Se a arte
não for insurrecta
se não permanecer
pedra viva escaldante
é o quê ?
a arte se não disser Eu Sou ?
Dizer eu sou, significando a essência do que se é, neste caso ( como noutros) artesão da dissidência, é cada vez mais difícil nos dias que correm.
E decidir-se a editar uma revista de arte que será de poucos, devendo ser de muitos, é nestes dias que correm outro acto de insubmissão.
Mas é nesta insubmissão que se respira, e é dado a ver um coração que bate.
E decidir-se a editar uma revista de arte que será de poucos, devendo ser de muitos, é nestes dias que correm outro acto de insubmissão.
Mas é nesta insubmissão que se respira, e é dado a ver um coração que bate.
Postagem de Yvette Centeno, blog Literatura e Arte
segunda-feira, 22 de março de 2010
domingo, 21 de março de 2010
ISABEL DE SÁ
DENTRO DAS IMAGENS
Os poemas têm veneno na boca.
Na estrada da minha vida
plantei a árvore
sem saber quem era.
Em que parte do planeta
há mais ódio? A matéria
erosiva transforma o corpo
e não há regresso. Não
restará um monte de estrume.
Em todo o lado
parece que o mundo em desordem
pouco a pouco enlouqueceu
e os homens atam a corda
à espera que aconteça.
São infelizes
mas não o suficiente.
Não sabem dizer
por que se esquecem de amar.
RESUMO, a poesia em 2009, edição Assírio & Alvim, Lisboa, 2010
Os poemas têm veneno na boca.
Na estrada da minha vida
plantei a árvore
sem saber quem era.
Em que parte do planeta
há mais ódio? A matéria
erosiva transforma o corpo
e não há regresso. Não
restará um monte de estrume.
Em todo o lado
parece que o mundo em desordem
pouco a pouco enlouqueceu
e os homens atam a corda
à espera que aconteça.
São infelizes
mas não o suficiente.
Não sabem dizer
por que se esquecem de amar.
RESUMO, a poesia em 2009, edição Assírio & Alvim, Lisboa, 2010
DIA DA POESIA - 21 DE MARÇO
CANÇÃO DA MAIS ALTA TORRE
Que venha, que venha
O tempo da apanha.
Eu esperei tanto
Que tudo esqueci.
As raivas, o pranto
Acabam-se aqui.
E uma sede langue
Escurece-me o sangue.
Que venha, que venha
O tempo da apanha.
Como o descampado
De flores de abandono
Coberto, deixado
Ao incenso e ao sono,
Para voos atrozes
De moscas ferozes.
Que venha, que venha
O tempo da apanha.
Uma Época No Inferno, tradução de Mário Cesariny, Portugália Editora, 1960
Que venha, que venha
O tempo da apanha.
Eu esperei tanto
Que tudo esqueci.
As raivas, o pranto
Acabam-se aqui.
E uma sede langue
Escurece-me o sangue.
Que venha, que venha
O tempo da apanha.
Como o descampado
De flores de abandono
Coberto, deixado
Ao incenso e ao sono,
Para voos atrozes
De moscas ferozes.
Que venha, que venha
O tempo da apanha.
Uma Época No Inferno, tradução de Mário Cesariny, Portugália Editora, 1960
sexta-feira, 19 de março de 2010
DIA MUNDIAL DA POESIA - 21 DE MARÇO
terça-feira, 16 de março de 2010
12 de Março - Aula no ISEC - Lisboa
Sob a orientação da escritora e professora YVETTE CENTENO, foi dada uma aula sobre CAPAS, EDITORAS PORTUGUESAS CONTEMPORÂNEAS E GRAFISMOS
por JOÃO BORGES - autor dos blogs :
A aula decorreu com entusiasmo e agrado dos presentes.Ficaram fascinados com a beleza das capas expostas, as explicações detalhadas de João Borges, e a sensibilização ao mundo editorial português. Observaram que a participação de artistas plásticos e gráficos na área editorial era grande, e alguns dos artistas e poetas são actualmente de renome internacional.
Poesia 61 - VÁRIOS AUTORES - Capa de Manuel Baptista
segunda-feira, 15 de março de 2010
Poema de João Borges
O FELIZ ANIVERSÁRIO
I
Estou só frente à multidão.
Não tenho esperanças, nem sequer
um desejo a pedir. A trepidação
dos comboios lá em cima
faz-me estremecer o corpo cá em baixo,
mas por dentro
tudo está intacto.
Vejo as vamps e os homens de negócios,
falam ao telemóvel,
mas hoje, já toda a gente
me desejou feliz aniversário
e portanto não falo.
Dentro de momentos dará entrada
na linha 8 o comboio com destino
a Beja, efectua paragem
em todas as estações e apeadeiros
mas eu não vou tomá-lo.
Nem sequer levantar-me daqui
e voltar para casa. Por mais que ande,
por mais que fuja, o lugar, o meu,
é sempre o mesmo.
Anoitece.
Há alguns anos
estaria ansioso pela hora do jantar,
as prendas, contente porque era
mais um ano. Agora é menos um,
para o fim.
As luzes acendem-se na poeira preta
da cidade, e o vento sopra
entre os ossos deste esqueleto,
quase a levar-me com a poeira.
Este esqueleto
nada pensa de mim nem me deu
os parabéns. É fiel
à minha condição. Os carros também,
ao dar-me a noção de que estou
parado: passam nas duas vias,
e lateja a minha ferida.
Longe estão os amigos, as gargalhadas,
e até a noite de véspera,
em claro a olhar para trás.
Como sempre, levantei-me
a horas pouco civilizadas e olhei a minha vida
com a mais implacável indiferença.
João Borges
Gare do Oriente, Lisboa, 10 de Março, 2010
I
Estou só frente à multidão.
Não tenho esperanças, nem sequer
um desejo a pedir. A trepidação
dos comboios lá em cima
faz-me estremecer o corpo cá em baixo,
mas por dentro
tudo está intacto.
Vejo as vamps e os homens de negócios,
falam ao telemóvel,
mas hoje, já toda a gente
me desejou feliz aniversário
e portanto não falo.
Dentro de momentos dará entrada
na linha 8 o comboio com destino
a Beja, efectua paragem
em todas as estações e apeadeiros
mas eu não vou tomá-lo.
Nem sequer levantar-me daqui
e voltar para casa. Por mais que ande,
por mais que fuja, o lugar, o meu,
é sempre o mesmo.
Anoitece.
Há alguns anos
estaria ansioso pela hora do jantar,
as prendas, contente porque era
mais um ano. Agora é menos um,
para o fim.
As luzes acendem-se na poeira preta
da cidade, e o vento sopra
entre os ossos deste esqueleto,
quase a levar-me com a poeira.
Este esqueleto
nada pensa de mim nem me deu
os parabéns. É fiel
à minha condição. Os carros também,
ao dar-me a noção de que estou
parado: passam nas duas vias,
e lateja a minha ferida.
Longe estão os amigos, as gargalhadas,
e até a noite de véspera,
em claro a olhar para trás.
Como sempre, levantei-me
a horas pouco civilizadas e olhei a minha vida
com a mais implacável indiferença.
João Borges
Gare do Oriente, Lisboa, 10 de Março, 2010
segunda-feira, 8 de março de 2010
"NÃO SE NASCE MULHER : TORNA-SE" Simone de Beauvoir, escritora francesa (1908-1986)
8 de Março - o tal Dia da Mulher
Considerada desde sempre um homem falhado, ser ocasional, ser relativo, vivendo num mundo de homens em relação aos quais é definida por falta de qualidades, cumprindo as suas (deles) leis, voluntária ou involuntáriamente educada desde a mais tenra idade para a sua função de matriz, a mulher trava hoje uma irreversível luta de libertação, tanto mais difícil quanto não há nela a consciência de classe que torna solidários os negros, os proletários ou os judeus.
Com efeito, e usando as palavras da própria Simone de Beauvoir, «as mulheres vivem dispersas entre os homens, ligadas pelo habitat, pelo trabalho, pelos interesses económicos, pela condição social, a certos homens - pais ou maridos - mais intimamente do que às outras mulheres. Burguesas, são solidárias dos homens burgueses e não das mulheres proletárias; brancas, dos homens brancos e não das mulheres negras...»
Salvo raras excepções, só muito raramente a mulher tomou consciência de que a sua singularidade face ao homem não era um defeito mas tão- somente uma diferença.
Para essa tomada de consciência muito contribuiu a publicação em França de O Segundo Sexo, (Simone de Beauvoir) numa altura em que os movimentos feministas se limitavam a exigir o direito de voto ou a igualdade de salários, sem pôr em causa o problema muito mais profundo da condição feminina, que, para Simone de Beauvoir, não é inerente à natureza biológica da mulher, mas fundamentalmente imposta pela sociedade.
Portanto, exigir o reconhecimento da mulher como ser inteiro, responsável e livre é de tal modo revolucionário que põe em causa os próprios fundamentos da sociedade.
de O Segundo Sexo, Livraria Bertrand, 1975, tradução de Sérgio Milliet
sexta-feira, 5 de março de 2010
AS FEMINISTAS TRÊS MARIAS E O LIVRO POLÉMICO "NOVAS CARTAS PORTUGUESAS"
Em 1972, dois anos antes da Revolução dos Cravos e da independencia das colónias portuguesas no continente africano, publicou-se “As Novas Cartas Portuguesas”, pelas chamadas três Marias (as autoras, Maria Isabel Barreno, Maria Teresa Horta e Maria Velho da Costa); tal obra foi considerada uma ofensa ao regime e proibida; foi aberto um processo contra as autoras, ficaram famosas - foram proibidas de sair do país e não podiam ser referidas na imprensa, só se livrariam do processo após o 25 de Abril de 1974. Os textos foram considerados “imorais” e “pornográficos”, pois retratavam mulheres livres, que questionam a sua identidade e expressam o desejo de propor novas ideias sociais e religiosas; em tom de revelação, com várias vozes narrativas, a obra questiona os paradoxos possíveis na relação entre homens e mulheres.
Tal livro, composto por textos em prosa e em verso, pode ser considerado o introdutor do pensamento feminista na literatura portuguesa. As mulheres começam a falar sobre o seu corpo, sobre os prazeres e sofrimentos da sua relação carnal com os homens, e chocam a sociedade portuguesa. O livro é composto de fragmentos, o que expressa a própria concepção da mulher portuguesa, mas transmitindo uma só mensagem: a mulher também tem voz, e sabe falar.
Tal livro, composto por textos em prosa e em verso, pode ser considerado o introdutor do pensamento feminista na literatura portuguesa. As mulheres começam a falar sobre o seu corpo, sobre os prazeres e sofrimentos da sua relação carnal com os homens, e chocam a sociedade portuguesa. O livro é composto de fragmentos, o que expressa a própria concepção da mulher portuguesa, mas transmitindo uma só mensagem: a mulher também tem voz, e sabe falar.
As três escritoras assinam a obra em conjunto e jamais revelaram qual delas compôs cada fragmento. Vários estudos académicos foram realizados na tentativa de atribuir a autoria dos diversos textos, que compõem o livro, a partir da sua comparação com as obras literárias, posteriormente lançadas pelas autoras individualmente.
ANA DE CASTRO OSÓRIO - A PRIMEIRA FEMINISTA PORTUGUESA
Escritora, feminista e activista republicana, nasceu em 1872 e morreu em 1935. É considerada a fundadora da literatura infantil no nosso país. Escreveu alguns livros que foram utilizados como manuais escolares e publicou ainda uma obra marcante na sua época, a colecção Para as Crianças, que lhe ocupou perto de quatro décadas de trabalho.
O seu livro «As Mulheres Portuguesas» (1905) é uma colectânea de artigos fundamentais, sobre as principais questões femininas que nunca conheceu reedição, onde exorta as mulheres ao “trabalho e ao estudo”, que considera “passo definitivo para a libertação feminina” ,apelando para que as mulheres não façam do amor “o ideal único da existência”.
Ser feminista, diz, é “desejá-las criaturas de inteligência e de razão”.
Sobre a rapariga portuguesa da época é implacável e irónica: “não tem opiniões para não ser pedante, não lê para não ser doutora e não ver espavoridos os noivos”. Defende a igualdade de salários, “por igual trabalho, igual paga” e afirma que “nada mais justo, nada mais razoável, do que este caminhar seguro, embora lento, do espírito feminino para a sua autonomia.
quinta-feira, 4 de março de 2010
O MEU POETA PREFERIDO
Poema de JOAQUIM MANUEL MAGALHÃES
antes do Tsunami - UM TOLDO VERMELHO
OLHOS COR DE CHICOTE
Fiz uma casa com traves funestas
e a casa estava toda em fogo.
À hora da tarde quando o canto dos melros
e dos tentilhões começa a enlouquecer.
Por vezes a chama fugia da casa
à espera de viragem que não vinha.
A distância naufraga em soro branco,
o arbusto recolhe na falésia a profecia,
na carcuma onde a poalha não tem fim.
Torna-se ainda mais convulso
o remorso que tomba, ouvia-se
cada um dos soluços, pisados
por todos os que passavam.
Um nome ganha temor, a penumbra, o cipreste,
a crepitação das coisas que dizimam.
Um jorro negro é a sua frente.
E tu dizes-me: vais deixar
de ouvir as ondas, o verão não voltará,
podes esquecer e ser feliz.
Mas já é tarde. Não valia a pena
cada lágrima, a casa calcinada,
o bosque ao abandono, a geada no bebedouro,
o regresso de mais um sonho.
Em todos eles se liquefazem as árvores,
o torreão afogado do caminho, o curral,
o saque da fruta por larvas de uma grade.
E continua a arder no quarto
que rebenta.
Tudo se acumula na representação.
Assim um sismo
retira cidades do que foi cidade.
Então o fogo, cada uma das suas homilias,
corre pelo vazio veloz de todo o fogo.
No corpo desmantelado chamamos
à ignorância que de dentro nos mata
o destino, a casa arder,
a passageira ondulação final.
Incham os orgãos até à gangrena,
as mucosas apodrecem, os tendões
esmagam-se de encontro à terra
numa dança de cinza.
De vez em quando passam os cavalos,
vão pelo silêncio para o alto.
De cada vez os teus olhos pousam
na pradaria de silva e cana seca.
Passam os cavalos com o cavaleiro,
enredam arvoredos, o seu tropel sustém
tocas mineiras, muros derruídos, a tarde
uma canção em luta. Nada traz
nenhum aviso ao plaino ácido,
ao mundo sem açaime.
E chega o escuro
donde desaparecem os cavalos. A vigília
em ligadura, sufocações por trás do que não sabemos,
uma prag certa vez ouvida, incurável na recordação.
Líquidos que batem, molas que não agarram,
galhos donde evapora a seiva.
Uma casa arrasta para longe
do humano, a natureza traz-nos
ao que somos diante de coisa alguma.
Se eu tivesse uma máquina suspeita
que, de encontro ao pano da montanha
e do mar em seu redor, arrancasse
o que pelo sol fora abatido,
animais ominosos ouvir-se-iam de repente.
Assim, apenas em redor do meimendro
se debruçam os arcos rasteiros da arnica.
Tanto tempo os confundi com as azedas
pelo campo desarticulado.
Na cremação viscosa dos telhados,
no cerco dos olhos incapazes de seguir,
no alarme do verdete da fonte,
no túnel donde escorre a fuligem,
no perigo de passeios com cadastro
perdi todo o trevo desses lábios
que sabiam prender-se com os meus.
ALTA NOITE EM ALTA FRAGA, RELÓGIO D'ÁGUA, 2001
antes do Tsunami - UM TOLDO VERMELHO
OLHOS COR DE CHICOTE
Fiz uma casa com traves funestas
e a casa estava toda em fogo.
À hora da tarde quando o canto dos melros
e dos tentilhões começa a enlouquecer.
Por vezes a chama fugia da casa
à espera de viragem que não vinha.
A distância naufraga em soro branco,
o arbusto recolhe na falésia a profecia,
na carcuma onde a poalha não tem fim.
Torna-se ainda mais convulso
o remorso que tomba, ouvia-se
cada um dos soluços, pisados
por todos os que passavam.
Um nome ganha temor, a penumbra, o cipreste,
a crepitação das coisas que dizimam.
Um jorro negro é a sua frente.
E tu dizes-me: vais deixar
de ouvir as ondas, o verão não voltará,
podes esquecer e ser feliz.
Mas já é tarde. Não valia a pena
cada lágrima, a casa calcinada,
o bosque ao abandono, a geada no bebedouro,
o regresso de mais um sonho.
Em todos eles se liquefazem as árvores,
o torreão afogado do caminho, o curral,
o saque da fruta por larvas de uma grade.
E continua a arder no quarto
que rebenta.
Tudo se acumula na representação.
Assim um sismo
retira cidades do que foi cidade.
Então o fogo, cada uma das suas homilias,
corre pelo vazio veloz de todo o fogo.
No corpo desmantelado chamamos
à ignorância que de dentro nos mata
o destino, a casa arder,
a passageira ondulação final.
Incham os orgãos até à gangrena,
as mucosas apodrecem, os tendões
esmagam-se de encontro à terra
numa dança de cinza.
De vez em quando passam os cavalos,
vão pelo silêncio para o alto.
De cada vez os teus olhos pousam
na pradaria de silva e cana seca.
Passam os cavalos com o cavaleiro,
enredam arvoredos, o seu tropel sustém
tocas mineiras, muros derruídos, a tarde
uma canção em luta. Nada traz
nenhum aviso ao plaino ácido,
ao mundo sem açaime.
E chega o escuro
donde desaparecem os cavalos. A vigília
em ligadura, sufocações por trás do que não sabemos,
uma prag certa vez ouvida, incurável na recordação.
Líquidos que batem, molas que não agarram,
galhos donde evapora a seiva.
Uma casa arrasta para longe
do humano, a natureza traz-nos
ao que somos diante de coisa alguma.
Se eu tivesse uma máquina suspeita
que, de encontro ao pano da montanha
e do mar em seu redor, arrancasse
o que pelo sol fora abatido,
animais ominosos ouvir-se-iam de repente.
Assim, apenas em redor do meimendro
se debruçam os arcos rasteiros da arnica.
Tanto tempo os confundi com as azedas
pelo campo desarticulado.
Na cremação viscosa dos telhados,
no cerco dos olhos incapazes de seguir,
no alarme do verdete da fonte,
no túnel donde escorre a fuligem,
no perigo de passeios com cadastro
perdi todo o trevo desses lábios
que sabiam prender-se com os meus.
ALTA NOITE EM ALTA FRAGA, RELÓGIO D'ÁGUA, 2001
quarta-feira, 3 de março de 2010
A OBRA, ANTES DE TUDO, PERTENCE AO AUTOR.
OS LEITORES DO JOAQUIM MANUEL MAGALHÃES PODEM GOSTAR OU NÃO DO ÚLTIMO LIVRO - UM TOLDO VERMELHO
MAS O DIREITO A RASGAR, DESTRUIR, MODIFICAR, TSUNAMIZAR -É UM DIREITO DO POETA.
Como dizia o pintor KLEIN "Se pintasse o que os outros percebem e gostam, aborrecia-me"
terça-feira, 2 de março de 2010
segunda-feira, 1 de março de 2010
DREAM BROTHER MY KILLER MY LOVER - Acrílico s/tela -120x80cm, 2010
Este quadro vai estar em exposição na Galeria ARTES SOLAR DE STO. ANTÓNIO - Rua do Rosário - CCB - Porto
6 DE MARÇO - SÁBADO - INAUGURAÇÕES SIMULTÂNEAS -
MIGUEL BOMBARDA
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