A poeta e pintora Isabel de sá tem um blogue dedicado exclusivamente à sua obra literária e plástica. Quem o visitar encontra livros, criticas, poemas e pintura.
sábado, 22 de agosto de 2009
sexta-feira, 21 de agosto de 2009
A BELEZA DAS IMAGENS INTIMISTAS NO CINEMA DE TARKOVSKI
Andrei Tarskovsky (ou Tarkovski) nasceu a 4 de abril de 1932, em Sawraschje, perto de Moscovo . Morreu em Paris em 1986. Foi um dos mais criativos, inovadores e importantes cineastas surgidos no cinema soviético. A sua obra é atravessada por um caráter introspectivo, complexo e onde as questões humanas são colocadas em primeiro plano.
Filho do poeta russo Arseni Tarkovski, autor de muitos dos poemas recitados nos seus filmes. Formado em Geologia, abandona a profissão para se dedicar ao cinema. Em 1960 dirige o seu primeiro filme - O Rolo Compressor e O Violinista e em 1962 ganha o Leão de Ouro no Festival de Veneza com o seu segundo trabalho - A Infância de Ivan.
Com o ambicioso filme Andrey Rublev (1966), sobre a vida do famoso pintor russo, o realizador apresenta características que formariam a base principal de seu cinema: intimista, conciso e com atenção para os pormenores. Em 1972 lança Solaris, um filme misto de ficção científica e drama existencial, com discretas citações do filme 2001: Uma Odisséia no Espaço, de Stanley Kubrick. Esse filme é considerado por muitos o seu melhor trabalho.
Nos seus filmes posteriores, O espelho (1974), filme com traços autobiográficos e principalmente Stalker (1979), são prejudicados pela forte censura existente na URSS. Desiludido com o controle exercido sobre o seu trabalho, Tarkovski decide sair da URSS em 1983. Nesse mesmo ano lança Nostalgia. Ainda, depois de Nostalgia, filmaria O Sacrifício. De personalidade irritadiça e muitas vezes angustiada, o realizador sempre recusou qualquer tipo de influência e controle sobre o seu trabalho. A sua obra é marcada por um profundo sentido espiritual.
Filho do poeta russo Arseni Tarkovski, autor de muitos dos poemas recitados nos seus filmes. Formado em Geologia, abandona a profissão para se dedicar ao cinema. Em 1960 dirige o seu primeiro filme - O Rolo Compressor e O Violinista e em 1962 ganha o Leão de Ouro no Festival de Veneza com o seu segundo trabalho - A Infância de Ivan.
Com o ambicioso filme Andrey Rublev (1966), sobre a vida do famoso pintor russo, o realizador apresenta características que formariam a base principal de seu cinema: intimista, conciso e com atenção para os pormenores. Em 1972 lança Solaris, um filme misto de ficção científica e drama existencial, com discretas citações do filme 2001: Uma Odisséia no Espaço, de Stanley Kubrick. Esse filme é considerado por muitos o seu melhor trabalho.
Nos seus filmes posteriores, O espelho (1974), filme com traços autobiográficos e principalmente Stalker (1979), são prejudicados pela forte censura existente na URSS. Desiludido com o controle exercido sobre o seu trabalho, Tarkovski decide sair da URSS em 1983. Nesse mesmo ano lança Nostalgia. Ainda, depois de Nostalgia, filmaria O Sacrifício. De personalidade irritadiça e muitas vezes angustiada, o realizador sempre recusou qualquer tipo de influência e controle sobre o seu trabalho. A sua obra é marcada por um profundo sentido espiritual.
A propósito da crítica literária
(...)
(...)
A pura razão crítica
E aqui reside um outro motivo polémico deste livro: que critério poderá levar JMM a expulsar da sua cidade ( explicita ou implicitamente) poetas como Ramos Rosa ou Gastão Cruz ( e toda a Poesia 61 em geral, com a excepção de Luiza Neto Jorge) e a acolher com tão boa vontade outros que nem são reconhecidos como poetas (refiro-me a Pedro Ayres de Magalhães) ou caíram no irremedível esquecimento público por serem considerados irrelevantes (por exemplo: António Manuel Couto Viana)? Joaquim Manuel Magalhães sabe perfeitamente que, sozinho, por mais autoridade que tenha, dificilmente sanciona um poeta e reabilita outro. Geralmente, isso não acontece senão através de mecanismos de reconhecimento colectivo. E também sabe o quanto existe de paranóico e de desrazão no acto de sustentar uma tese contra uma comunidade inteira - de intelectuais, de críticos - por mais cretina que ela seja. (...)
António Guerreiro, Expresso, 26 de Agosto de 1989
(...) creio que a relevância da crítica para a aceitação deste ou daquele autor se tornou talvez menor do que há 40 ou 50 anos - digamos no tempo de um João Gaspar Simões -, quando a palavra do crítico A ou do crítico B adquiria um peso decisivo (e talvez excessivo). O reconhecimento público de um determinado livro passa hoje por dois tipos de mecanismos diferentes, que podem aliás complementar-se: os primeiros obedecem a um ritmo muito rápido (cerca de três meses ou pouco mais) e dependem de estratégias de promoção editorial - lançamentos, entrevistas, pré-publicações, campanhas que levam os escritores a apresentar as suas obras pelo país ou pelo mundo fora, etc. Os segundos, de ritmo muito mais lento, implicam uma progressiva consagração crítica, sujeita a altos e baixos, que pode demorar longos anos e se dá sobretudo no espaço das universidades ou das chamadas revistas literárias - não forçosamente universitárias - cujos artigos podem sair muito tempo depois da publicação dos livros. Nada disto constitui novidade para ninguém - é apenas um retrato da situação actual e não entendo como pode sequer suscitar polémica.
Fernando Pinto do Amaral, revista Apeadeiro, nº3, Quasi Edições, 2003
quinta-feira, 20 de agosto de 2009
Poema de JOÃO BORGES
Cada pessoa enrola
um pouco mais
o pano preto da noite
à volta do meu corpo.
Agora, é lentamente
que me matam
e eu deixo. Fico parado
a sorrir, sem saber porquê.
Posso amar ou enlouquecer
quando te entregas,
sem rodeios,
na solidão das cidades.
Adormecidos no chão,
o brilho da pele,
nas gavetas o silêncio.
Escrevemos na parede,
sobre a cama,
que seria para sempre.
Brilho no Escuro, revista de poesia, nº1, edições anjo da guarda, Porto, 2009
Cada pessoa enrola
um pouco mais
o pano preto da noite
à volta do meu corpo.
Agora, é lentamente
que me matam
e eu deixo. Fico parado
a sorrir, sem saber porquê.
Posso amar ou enlouquecer
quando te entregas,
sem rodeios,
na solidão das cidades.
Adormecidos no chão,
o brilho da pele,
nas gavetas o silêncio.
Escrevemos na parede,
sobre a cama,
que seria para sempre.
Brilho no Escuro, revista de poesia, nº1, edições anjo da guarda, Porto, 2009
Poema de JOSÉ MIGUEL SILVA
Ameaças
Aviso-te, velhaca, mais uma vez:
mete-te com os da tua laia, ladra,
que me levaste da mesa os copos
por onde bebia e deixaste na alma
as cadeiras frias. Arrepende-te, Morte,
e devolve-me as veias, os amigos,
as sementes de papoila. Restitui-me o intacto
futuro da minha juventude, a fotografia
onde cabíamos todos e a minha solidão
era uma onda quebrada nas pedras de gelo.
Traz-me de volta o silêncio do Jaime,
o cheiro a serrim, traz-me o Leal e ainda
o Artur, com todas as músicas desse verão,
o nó da fortuna, de '89. Não te esqueças
também do Luís, deixou por contar
o resto da história. Nem do Joel,
o mais desgraçado rapaz,
que me confessou um dia haver morrido
sem nunca ter sido beijado.
Fazes-me isso, e perdoo-te o resto. Mas
se torno a ver-te a menos de quinze passos
dos meus - eu juro que te mato.
Ulisses já não mora aqui, & etc, 2002
Ameaças
Aviso-te, velhaca, mais uma vez:
mete-te com os da tua laia, ladra,
que me levaste da mesa os copos
por onde bebia e deixaste na alma
as cadeiras frias. Arrepende-te, Morte,
e devolve-me as veias, os amigos,
as sementes de papoila. Restitui-me o intacto
futuro da minha juventude, a fotografia
onde cabíamos todos e a minha solidão
era uma onda quebrada nas pedras de gelo.
Traz-me de volta o silêncio do Jaime,
o cheiro a serrim, traz-me o Leal e ainda
o Artur, com todas as músicas desse verão,
o nó da fortuna, de '89. Não te esqueças
também do Luís, deixou por contar
o resto da história. Nem do Joel,
o mais desgraçado rapaz,
que me confessou um dia haver morrido
sem nunca ter sido beijado.
Fazes-me isso, e perdoo-te o resto. Mas
se torno a ver-te a menos de quinze passos
dos meus - eu juro que te mato.
Ulisses já não mora aqui, & etc, 2002
Dois poemas de ROSA ALICE BRANCO
Palmeiras inclinadas. Ao longe o casario. É na água que o vejo, que sinto a cidade acordar.
Mais uma mulher que olha o rio. Tenho as mãos desatadas, os pés a caminho. As margens alargam quando estou perto, mas do outro lado as mulheres não reflectem o rosto ou mesmo a sua ausência.
São matéria do verbo fazer e caminham junto ao chão, na curva da noite para o marido. Gastos os sonhos por usar. Descorado pano que ficou ao sol. Nelas a cidade não acorda, não regressam os barcos à tardinha.
Vêm pela beira dos caminhos, a tristeza amável, a raiva cega e às vezes um sorriso que sacode os ombros porque até a tristeza tem um custo, uma esperança na sola do sapato. Vejo-as todos os dias e é como se a vida me atasse os pés, me anelasse os dedos. Como eu, outras mulheres olhando o rio, desbordando o pano, descozendo a sopa. Ama-se o homem que vira a esquina connosco e sabe que não podemos fingir que a ferida está fechada. As casas acendem.
E na água que vejo a sua luz descendo o rio. As mulheres passam em silêncio para as casas, atravessam a pele — deixam um retrato puído nas entranhas. Olho o rio e não sei fingir que finjo tanto mar.
Vozes e Olhares no Feminino, Edições Afrontamento, Porto 2001 p. 147
Palmeiras inclinadas. Ao longe o casario. É na água que o vejo, que sinto a cidade acordar.
Mais uma mulher que olha o rio. Tenho as mãos desatadas, os pés a caminho. As margens alargam quando estou perto, mas do outro lado as mulheres não reflectem o rosto ou mesmo a sua ausência.
São matéria do verbo fazer e caminham junto ao chão, na curva da noite para o marido. Gastos os sonhos por usar. Descorado pano que ficou ao sol. Nelas a cidade não acorda, não regressam os barcos à tardinha.
Vêm pela beira dos caminhos, a tristeza amável, a raiva cega e às vezes um sorriso que sacode os ombros porque até a tristeza tem um custo, uma esperança na sola do sapato. Vejo-as todos os dias e é como se a vida me atasse os pés, me anelasse os dedos. Como eu, outras mulheres olhando o rio, desbordando o pano, descozendo a sopa. Ama-se o homem que vira a esquina connosco e sabe que não podemos fingir que a ferida está fechada. As casas acendem.
E na água que vejo a sua luz descendo o rio. As mulheres passam em silêncio para as casas, atravessam a pele — deixam um retrato puído nas entranhas. Olho o rio e não sei fingir que finjo tanto mar.
Vozes e Olhares no Feminino, Edições Afrontamento, Porto 2001 p. 147
POR UM DIA DE INVERNO
O homem do talho morreu. Deixou mulher,
dois filhos e carne fresca estendida como roupa
no varal. Lembro-me do orgulho com que passava a mão
pelo cachaço. Lembro-me da peixeira
que nos acordava de manhã «peixe fresco
tão vivinho» e como era caro o estertor do linguado.
Mesmo as alfaces são frescas depois de mortas,
o molho de nabiças, até de uma cenoura esperamos
que seja fresca ali no prato com o linguado rigorosamente
apartado das espinhas. Tão fresco! O homem do talho
vai a enterrar depois do almoço. Agora jaz na capela mortuária
de rosto descoberto para a família e os curiosos. O homem
do talho morreu cansado, mas agora está fresco:
foi abatido ontem, será embalado às quatro da tarde.
Da Alma e dos Espíritos Animais, Porto, Campo das Letras, 2001
O homem do talho morreu. Deixou mulher,
dois filhos e carne fresca estendida como roupa
no varal. Lembro-me do orgulho com que passava a mão
pelo cachaço. Lembro-me da peixeira
que nos acordava de manhã «peixe fresco
tão vivinho» e como era caro o estertor do linguado.
Mesmo as alfaces são frescas depois de mortas,
o molho de nabiças, até de uma cenoura esperamos
que seja fresca ali no prato com o linguado rigorosamente
apartado das espinhas. Tão fresco! O homem do talho
vai a enterrar depois do almoço. Agora jaz na capela mortuária
de rosto descoberto para a família e os curiosos. O homem
do talho morreu cansado, mas agora está fresco:
foi abatido ontem, será embalado às quatro da tarde.
Da Alma e dos Espíritos Animais, Porto, Campo das Letras, 2001
Poema de José Miguel Silva
Pelos beijos que poupei,
pelas pratas empenhadas,
pelas horas que não sei
onde foram derrubadas;
pelo breve candeeiro
que me tem encandeado,
pela falta de dinheiro
para o supermercado;
pela fuga dos amigos,
pela música calada,
pelos dias resumidos
ao encontro com o nada;
pelo pó da autoria
no fundo das estantes,
e pela miopia
dos soluços dominantes;
pela tinta nos meus dedos,
pelos passos sem destino,
pelos tojos e penedos
no meio do caminho;
pela vida dicionária,
exangue de ilusão,
e a arte solitária
de morrer do coração.
José Miguel Silva, in O Sino de Areia, Gilgamesh, Agosto de 1999.
Pelos beijos que poupei,
pelas pratas empenhadas,
pelas horas que não sei
onde foram derrubadas;
pelo breve candeeiro
que me tem encandeado,
pela falta de dinheiro
para o supermercado;
pela fuga dos amigos,
pela música calada,
pelos dias resumidos
ao encontro com o nada;
pelo pó da autoria
no fundo das estantes,
e pela miopia
dos soluços dominantes;
pela tinta nos meus dedos,
pelos passos sem destino,
pelos tojos e penedos
no meio do caminho;
pela vida dicionária,
exangue de ilusão,
e a arte solitária
de morrer do coração.
José Miguel Silva, in O Sino de Areia, Gilgamesh, Agosto de 1999.
quarta-feira, 12 de agosto de 2009
Fotos da capa, contracapa, poetas e ficcionistas por
GRAÇA SARSFIELD

GRAÇA SARSFIELD

Antologia que reúne textos inéditos de todas as participantes em sessões do Ciclo “Vozes e Olhares no Feminino”, da programação de Literatura da Porto 2001, ocorridas no Auditório da Biblioteca Municipal Almeida Garrett.
O livro conta com trabalhos das seguintes autoras:
Em poesia, Adília Lopes, Ana Hatherly, Ana Luísa Amaral, Fátima Maldonado, Helga Moreira, Inês Lourenço, Isabel de Sá, Maria Teresa Horta, Regina Guimarães, Rosa Alice Branco, Sophia de Mello Breyner Andresen e Yvette Centeno.
Em ficção, Agustina Bessa-Luís, Clara Pinto Correia, Helena Marques, Hélia Correia, Isabel Barreno, Julieta Monginho, Lídia Jorge, Luísa Costa Gomes, Luísa Dacosta, Mafalda Ivo Cruz, Maria Velho da Costa e Teolinda Gersão.
Na área do ensaio, as participações são de Ana Gabriela Macedo, Clara Rocha, Fátima Freitas Morna, Helena Buescu, Isabel Allegro Magalhães, Laura Bulger, Maria Alzira Seixo, Maria de Fátima Marinho, Maria de Lurdes Sampaio, Maria Irene Ramalho, Maria João Reynaud, Paula Morão e Rosa Maria Martelo.
Edições Afrontamento, Porto 2001
O livro conta com trabalhos das seguintes autoras:
Em poesia, Adília Lopes, Ana Hatherly, Ana Luísa Amaral, Fátima Maldonado, Helga Moreira, Inês Lourenço, Isabel de Sá, Maria Teresa Horta, Regina Guimarães, Rosa Alice Branco, Sophia de Mello Breyner Andresen e Yvette Centeno.
Em ficção, Agustina Bessa-Luís, Clara Pinto Correia, Helena Marques, Hélia Correia, Isabel Barreno, Julieta Monginho, Lídia Jorge, Luísa Costa Gomes, Luísa Dacosta, Mafalda Ivo Cruz, Maria Velho da Costa e Teolinda Gersão.
Na área do ensaio, as participações são de Ana Gabriela Macedo, Clara Rocha, Fátima Freitas Morna, Helena Buescu, Isabel Allegro Magalhães, Laura Bulger, Maria Alzira Seixo, Maria de Fátima Marinho, Maria de Lurdes Sampaio, Maria Irene Ramalho, Maria João Reynaud, Paula Morão e Rosa Maria Martelo.
Edições Afrontamento, Porto 2001
segunda-feira, 10 de agosto de 2009
Considerações sobre um poema de JORGE DE SENA
Joaquim Manuel Magalhães
OS DOIS CREPÚSCULOS - Sobre poesia portuguesa actual e outras crónicas
(...) Em Sobre Esta Areia...oito meditações sobre o Pacífico, o seu último volume de poemas até esta data, anuncia uma visão das relações dos corpos, uma superação dos recalcamentos colectivos, uma referência à multiplicidade do amor que culminam as suas várias narrativas sobre a multiforme explosão do prazer, o qual é um dos núcleos mais tensos da atenção humana e literária da nossa época. No passo a seguir transcrito, vêem-se dois corpos de homem e outro de mulher que entre si tivessem distribuído o que de prazer os corpos podem alcançar em habituação sexual, que lhes permite estar juntos como que depois das marcas do desejo.
Joaquim Manuel Magalhães
OS DOIS CREPÚSCULOS - Sobre poesia portuguesa actual e outras crónicas
(...) Em Sobre Esta Areia...oito meditações sobre o Pacífico, o seu último volume de poemas até esta data, anuncia uma visão das relações dos corpos, uma superação dos recalcamentos colectivos, uma referência à multiplicidade do amor que culminam as suas várias narrativas sobre a multiforme explosão do prazer, o qual é um dos núcleos mais tensos da atenção humana e literária da nossa época. No passo a seguir transcrito, vêem-se dois corpos de homem e outro de mulher que entre si tivessem distribuído o que de prazer os corpos podem alcançar em habituação sexual, que lhes permite estar juntos como que depois das marcas do desejo.
É um poema sobre quase todo o amor. Sobre, também, o olhar sem repressão. Sobre a justa medida que existe «entre o passado e este presente». Californiano embora, mas mandado em poema para onde se teme viver. (...)
Editora, A Regra do Jogo, Lisboa, 1981
Poema de JORGE DE SENA
Deitados no sabor de ao sol queimarem
o mais oculto de si mesmos são
dois jovens e uma jovem misturados.
Um dos rapazes se recosta contra o corpo
do outro rapaz que alonga dorso e pernas,
enquanto neste se debruça e dobra,
pendendo os frescos seios e os cabelos,
o corpo feminino associado aos de ambos.
Mas nada indica excitação nos machos
de quem se pousa o sexo ou distendido pende
em de sereno indiferente como
a só vazia de ausência mistério
que a corpos dava um fervor quente e humano.
São, como deuses, animais sem cio?
Ou são, como animais, humanos, que se aceitam?
Ela é de quem? De um deles só, dos dois?
Um deles será dela mas também do outro?
Será cada um dos três dos outros dois?
Ambos os machos serão fêmeas do outro?
Ou sou um deles? Qual dos dois? O que
sentado se recosta? O que deitado
aceita contra o seu corpo recostado?
Sobre Esta Praia... Oito Meditações à beira do Pacifico (1979), cuja primeira edição em Português foi publicada pela Editorial Inova, em 1977.
Deitados no sabor de ao sol queimarem
o mais oculto de si mesmos são
dois jovens e uma jovem misturados.
Um dos rapazes se recosta contra o corpo
do outro rapaz que alonga dorso e pernas,
enquanto neste se debruça e dobra,
pendendo os frescos seios e os cabelos,
o corpo feminino associado aos de ambos.
Mas nada indica excitação nos machos
de quem se pousa o sexo ou distendido pende
em de sereno indiferente como
a só vazia de ausência mistério
que a corpos dava um fervor quente e humano.
São, como deuses, animais sem cio?
Ou são, como animais, humanos, que se aceitam?
Ela é de quem? De um deles só, dos dois?
Um deles será dela mas também do outro?
Será cada um dos três dos outros dois?
Ambos os machos serão fêmeas do outro?
Ou sou um deles? Qual dos dois? O que
sentado se recosta? O que deitado
aceita contra o seu corpo recostado?
Sobre Esta Praia... Oito Meditações à beira do Pacifico (1979), cuja primeira edição em Português foi publicada pela Editorial Inova, em 1977.
sábado, 8 de agosto de 2009
Poema de RUI LAGE
HORTUS CLAUSUS
O olhar sobe as escadas da paisagem.
Muros atravessam-na duplamente
em amplos charcos de água.
Pequeno pássaro pousa
pequeno pensamento
no ramo que o frio despiu.
Nevoeiro o cerca, erguendo
vagarosos braços de lama
dissolvidos pela chuva.
Cheias de musgo e de bosta
estão as pedras do passado
de algum dono aprendido
sentam-se nelas poemas
cada vez menos aptos
a falar de mim.
Uma charneca o céu
a terra uma cisterna
que transborda.
Sou levado,
mas não irei longe
com tamanha ferrugem nos olhos.
HORTUS CLAUSUS
O olhar sobe as escadas da paisagem.
Muros atravessam-na duplamente
em amplos charcos de água.
Pequeno pássaro pousa
pequeno pensamento
no ramo que o frio despiu.
Nevoeiro o cerca, erguendo
vagarosos braços de lama
dissolvidos pela chuva.
Cheias de musgo e de bosta
estão as pedras do passado
de algum dono aprendido
sentam-se nelas poemas
cada vez menos aptos
a falar de mim.
Uma charneca o céu
a terra uma cisterna
que transborda.
Sou levado,
mas não irei longe
com tamanha ferrugem nos olhos.
sexta-feira, 7 de agosto de 2009
Análise ao livro de António Lobo Antunes
Ontem Não Te Vi Em Babilónia
autor do blog http://camelecocacola.blogspot.com
e postado no site http://www.ala.nletras.com/videos.htm
de António Lobo Antunes
Há 28 anos, António Lobo Antunes era um novo escritor, a publicar (No mesmo ano) os dois primeiros romances, “Memória de Elefante” e “Os Cus de Judas” (1979). A escrita, aparentemente sem influências, fez deste psiquiatra não só uma das mais importantes e originais vozes da literatura do pós-25 de Abril, como um dos cronistas mais credíveis da transição do Portugal da época da ditadura, até ao actual, usando com particular incidência os horrores da Guerra Colonial, onde o escritor esteve durante dois anos.
28 anos depois (Visto eu ter gostado do filme “28 Dias Depois”.), com todas as inevitáveis (E ainda bem.) evoluções, a escrita de António Lobo Antunes é uma das mais importantes e apreciadas quer no contexto da literatura portuguesa, quer no contexto da literatura mundial.
“Ontem Não Te Vi Em Babilónia” é o romance mais recente do autor. Nas entrevistas, Lobo Antunes afirma não querer contar histórias, mas sim vidas, e foi o que fez, no seu 18º romance: ele conta as vidas destas pessoas, e entrelaça essas vidas, mas sem criar um enredo, colocando-as a deambular por uma terra sem dono.
Uma noite, estas pessoas não adormecem, têm insónias. Deitadas na cama, revisitam o seu passado, relatam-no, comentam-no, descobrem-no e por vezes, inventam-no. Nem todos os personagens falam o mesmo número de vezes, havendo quatro que se destacam, e essas quatro têm em comum o facto de terem sido testemunhas do suicídio de uma rapariga, que se enforcou numa macieira.
São encontros e desencontros, mas há sempre uma tremenda melancolia, em cada linha, em cada frase que se repete como um eco (Característica muito lobo-antuniana.), há o sofrimento de quatro pessoas vítimas de si mesmas e das suas escolhas. Todas têm um segredo. E vão revelando o seu segredo, sem pressa, aos poucos.
A força do livro é impressionante. É honesto e realista, chegando por vezes a ser agressivo ou a atingir quem lê (O exemplo de uma das personagens que acusa quem lê de ir esquecer-se dela quando terminar a leitura do livro.), revelando-se, no fim, um texto que ultrapassa as potencialidades reais que tem: aquilo que o livro é, na realidade, não oferece muitas possibilidades de este ser um romance assinalavelmente bom, nem sequer no contexto da obra do seu autor; mas a verdade é que é tão bem conduzido, e de uma forma tão pouco enganadora, que acaba por contornar essa condenação prévia.
Ao fim de 479 páginas (Algumas a menos, ainda assim, não seriam fatais.), Lobo Antunes afirma que o que escreve pode ler-se no escuro. E pode. Infiltra-se e morde de tal forma o leitor, que pode ser lido no escuro, talvez seja melhor que nos morda no escuro.
“Ontem Não Te Vi Em Babilónia” é obviamente incapaz de ultrapassar a grandiosidade do magma de romances como “Eu Hei-de Amar Uma Pedra” ou “O Manual dos Inquisidores”, mas é igualmente óbvio que é um dos melhores livros do ano.
por Supermassive Black-Hole
em Camel & Coca Cola
Há 28 anos, António Lobo Antunes era um novo escritor, a publicar (No mesmo ano) os dois primeiros romances, “Memória de Elefante” e “Os Cus de Judas” (1979). A escrita, aparentemente sem influências, fez deste psiquiatra não só uma das mais importantes e originais vozes da literatura do pós-25 de Abril, como um dos cronistas mais credíveis da transição do Portugal da época da ditadura, até ao actual, usando com particular incidência os horrores da Guerra Colonial, onde o escritor esteve durante dois anos.
28 anos depois (Visto eu ter gostado do filme “28 Dias Depois”.), com todas as inevitáveis (E ainda bem.) evoluções, a escrita de António Lobo Antunes é uma das mais importantes e apreciadas quer no contexto da literatura portuguesa, quer no contexto da literatura mundial.
“Ontem Não Te Vi Em Babilónia” é o romance mais recente do autor. Nas entrevistas, Lobo Antunes afirma não querer contar histórias, mas sim vidas, e foi o que fez, no seu 18º romance: ele conta as vidas destas pessoas, e entrelaça essas vidas, mas sem criar um enredo, colocando-as a deambular por uma terra sem dono.
Uma noite, estas pessoas não adormecem, têm insónias. Deitadas na cama, revisitam o seu passado, relatam-no, comentam-no, descobrem-no e por vezes, inventam-no. Nem todos os personagens falam o mesmo número de vezes, havendo quatro que se destacam, e essas quatro têm em comum o facto de terem sido testemunhas do suicídio de uma rapariga, que se enforcou numa macieira.
São encontros e desencontros, mas há sempre uma tremenda melancolia, em cada linha, em cada frase que se repete como um eco (Característica muito lobo-antuniana.), há o sofrimento de quatro pessoas vítimas de si mesmas e das suas escolhas. Todas têm um segredo. E vão revelando o seu segredo, sem pressa, aos poucos.
A força do livro é impressionante. É honesto e realista, chegando por vezes a ser agressivo ou a atingir quem lê (O exemplo de uma das personagens que acusa quem lê de ir esquecer-se dela quando terminar a leitura do livro.), revelando-se, no fim, um texto que ultrapassa as potencialidades reais que tem: aquilo que o livro é, na realidade, não oferece muitas possibilidades de este ser um romance assinalavelmente bom, nem sequer no contexto da obra do seu autor; mas a verdade é que é tão bem conduzido, e de uma forma tão pouco enganadora, que acaba por contornar essa condenação prévia.
Ao fim de 479 páginas (Algumas a menos, ainda assim, não seriam fatais.), Lobo Antunes afirma que o que escreve pode ler-se no escuro. E pode. Infiltra-se e morde de tal forma o leitor, que pode ser lido no escuro, talvez seja melhor que nos morda no escuro.
“Ontem Não Te Vi Em Babilónia” é obviamente incapaz de ultrapassar a grandiosidade do magma de romances como “Eu Hei-de Amar Uma Pedra” ou “O Manual dos Inquisidores”, mas é igualmente óbvio que é um dos melhores livros do ano.
por Supermassive Black-Hole
em Camel & Coca Cola
Poema de ADÍLIA LOPES
A propósito de estrelas
Não sei se me interessei pelo rapaz
por ele se interessar por estrelas
se me interessei por estrelas por me interessar
pelo rapaz hoje quando penso no rapaz
penso em estrelas e quando penso em estrelas
penso no rapaz como me parece
que me vou ocupar com as estrelas
até ao fim dos meus dias parece-me que
não vou deixar de me interessar pelo rapaz
até ao fim dos meus dias
nunca saberei se me interesso por estrelas
se me interesso por um rapaz que se interessa
por estrelas já não me lembro
se vi primeiro as estrelas
se vi primeiro o rapaz
se quando vi o rapaz vi as estrelas
de "Um jogo bastante perigoso", Obra, Lisboa, Mariposa Azul, 2000
A propósito de estrelas
Não sei se me interessei pelo rapaz
por ele se interessar por estrelas
se me interessei por estrelas por me interessar
pelo rapaz hoje quando penso no rapaz
penso em estrelas e quando penso em estrelas
penso no rapaz como me parece
que me vou ocupar com as estrelas
até ao fim dos meus dias parece-me que
não vou deixar de me interessar pelo rapaz
até ao fim dos meus dias
nunca saberei se me interesso por estrelas
se me interesso por um rapaz que se interessa
por estrelas já não me lembro
se vi primeiro as estrelas
se vi primeiro o rapaz
se quando vi o rapaz vi as estrelas
de "Um jogo bastante perigoso", Obra, Lisboa, Mariposa Azul, 2000
quinta-feira, 6 de agosto de 2009
POEMA DE ARMINDO RODRIGUES
LIBERDADE
Ser livre é querer ir e ter um rumo
e ir sem medo,
mesmo que sejam vãos os passos.
É pensar e logo
transformar o fumo
do pensamento em braços.
É não ter pão nem vinho,
só ver portas fechadas e pessoas hostis
e arrancar teimosamente do caminho
sonhos de sol
com fúria de raiz.
É estar atado, amordaçado, em sangue , exausto
e, mesmo assim,
só de pensar
gritar
e só de pensar ir
ir e chegar ao fim.
LIBERDADE
Ser livre é querer ir e ter um rumo
e ir sem medo,
mesmo que sejam vãos os passos.
É pensar e logo
transformar o fumo
do pensamento em braços.
É não ter pão nem vinho,
só ver portas fechadas e pessoas hostis
e arrancar teimosamente do caminho
sonhos de sol
com fúria de raiz.
É estar atado, amordaçado, em sangue , exausto
e, mesmo assim,
só de pensar
gritar
e só de pensar ir
ir e chegar ao fim.
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